Era Uma Vez (4/?)

Oct 24, 2008 19:15

Título:Era uma Vez
Autora:Saavik
Pares:Hilson, 14, Chameron e CPI
Classificação: PG-13 (esse capítulo. Ainda não decidi o resto)

-Como assim, você é manco?!?!?!?

-Qual é o problema, alteza?- inquiriu o bandido dos olhos de safira, dando dois passos à frente, com ajuda da bengala que só agora a princesa percebera. -Sente-se ofendido por ter sido derrotado por um aleijado?

-Não. Apenas abismado com minha burrice em não ter exigido que descêssemos dos cavalos...

-Perdão, mas não creio que você estivesse em posição de fazer exigências. Assim como não está agora... - ele se voltou para seus homens do lado de fora. - Crianças, arrumem as malas! Teremos que nos mudar de novo!

Ouviram-se algumas reclamações. Por fim, o chefe declarou que eram todos uns bebês chorões, e tornou novamente a atenção aos príncipes.

-Obrigado por descobrir o esconderijo provisório e nos forçar a outra mudança, alteza. É sempre divertido irritá-los. Agora, quanto a vossas majestades... Naturalmente terão de viajar vendados.

-EI!- começou a protestar Cameron, antes de ser interrompida por seu captor.

-Não reclame comigo! Foi culpa do seu namorado!- Estranhamente, algo no tom dele era divertido... Não parecia estar realmente irritado, apenas implicando com eles.

-Como poderemos viajar vendados?

-Na garupa dos cavalos, assim como você veio aqui! Bom, tenho que ir... Acampamentos secretos a serem montados. Divirtam-se brigando para decidir quem vai andar comigo.

E com isso, ele saiu.

Na realidade, a viagem não foi tão ruim assim. O cavaleiro que levava Cameron foi extremamente delicado (no final das contas, nem ela nem Wilson foram com o líder). O grande problema foi mesmo a exaustão. A cavalgada durou um dia inteiro, e embora não fizesse idéia de onde estavam, ela sabia que haviam dado muitas voltas, e tinha a vaga impressão de que por um tempo haviam andado dentro de um rio. Por fim, a desceram do animal. Duas horas depois, o acampamento estava novamente montado, e ela e Wilson foram conduzidos a tendas vizinhas pelo próprio bandido dos olhos de safira, que fez uma declaração assombrosa:

-Já que creio que vossas altezas estão completamente perdidas, vou conceder-lhes permissão para andar livremente pelo acampamento. Há guardas nos limites de nosso pequeno domínio 24 horas por dia, e acreditem, vocês não querem que eles os vejam tentando fugir. Mas desde que permaneçam por aqui, são livres para fazer o que quiserem. Aquele é o refeitório, aquela é a biblioteca, aqueles são os banheiros e aquele é o depósito. As outras tendas são apenas quartos. Caro príncipe, se quiser ir dar uma explorada, fique à vontade. Quero conversar com vocês separadamente e, para lhe provar que posso ser cavalheiro quando quero, vou atender primeiro à dama.

O rapaz de olhos claros que fora encarregado de Cameron no acampamento anterior estava passando por ali, e parou, chocado, ao ouvir estas palavras.

-E desde quando você precisa provar algo para alguém?

-Lucas! Você está falando na frente de uma menina? Uau, que orgulho...

-Estamos usando nomes agora? Ótimo! Cale a boca, House!

Ele se afastou, e o bandido riu, divertido.

-Bom... Acho que agora estamos realmente apresentados. Princesa, queira me acompanhar...

Wilson se colocou entre os dois.

-Fique longe dela.

House riu, mas antes que pudesse responder, Cameron resmungou, irritadamente:

-Eu sou bem grandinha, James, obrigada.

E, deixando o príncipe assustado, ela entrou na tenda com o novo conhecido.

-Então... - disse ele. -Eu ouvi dizer que você queria me conhecer.

-É verdade. Mas se está tão desesperado para provar que é um cavalheiro, poderia ter encontrado outra forma de me atender.- disse, com falsa frieza.

-Eu não sou um cavalheiro! Estou apenas zoando com Wilson... Mas shhh, não diga isso a ele.

-Algo me diz que ele consegue deduzir isto sozinho.

-Não o respeitaria caso não conseguisse. Mas então, alteza... Que deseja de mim?

Ela se atrapalhou.

-Eu... Eu apenas queria conhecê-lo.

-Por que?

Criando coragem, ela fitou diretamente os olhos brilhantes.

-Curiosidade, acho...

-Ah! Imaginei. Mas não esperava tamanha sinceridade! Bem, aqui estou... Sabe meu nome, como sou, aonde moro... Está satisfeita?

Ela não respondeu.

-Não deve estar... Afinal, certamente sou diferente do que você esperava! Mais velho, definitivamente. Nem um pouco bonito. Manco! E, apesar do que você disse a Wilson, não tenho sido nem um pouco gentil com você. Arranquei-te de dentro do seu quarto, a trouxe para o meio do nada, amarrada, e ainda assim... Você me olha desse jeito. Possui um lado masoquista, princesa?

Novamente, ela permaneceu em silêncio.

-Não... - prosseguiu ele. -Eu sei qual é o seu problema. Apesar de todos os meus defeitos, sou exatamente o que você quer. Porque sou uma pessoa problemática e danificada... E você acha que pode me consertar. Bom... Lamento informá-la, alteza, de que não preciso de conserto. Mas se não acredita nisso, fique à vontade para tentar. Receio, afinal, que terá de passar algum tempo conosco...

-O que?!?

-Não tenho dúvidas de que seus pais pagarão o resgate imediatamente. Mas estou enfrentando um pequeno problema que me impedirá de pedi-lo por alguns dias.

-Que problema?

-Desculpe, segredo de Estado! Vejo-a mais tarde.

Saindo, ele mancou até a tenda ao lado, onde o príncipe estava sentado, com uma expressão de extremo mau-humor.

-Não se preocupe- disse House, com seu jeito sarcástico- Eu a deixei intacta, juro.

-O que você quer?

-Como acabei de explicar à sua amiguinha, alguns problemas de ordem pessoal farão com que vocês sejam meus convidados por um tempo. Então pensei que seria apropriado nos conhecermos melhor.

Ao ser ignorado, ele simplesmente avançou, sentou ao lado de Wilson, e perguntou.

-Então... Com que idade salvou sua primeira princesa?

Silêncio.

-Eu não vou embora até você responder, sabe?

-10. Ela tinha 8, e estava se afogando.

-Awwww, seu complexo de Messias vem da infância!

-E você? Quantos anos tinha quando cometeu o primeiro crime?

Por um momento, Wilson pensou que não obteria resposta, pois House parecia surpreso, como se não estivesse acostumado a contra-ataques. Então, após um longo instante, ele declarou:

-2. Havia uma maçã em cima da mesa. Minha mãe disse para não pegar, e desobedeci.

-Isso não é um crime, é uma travessura infantil.

-Diga isso ao meu pai.  Já viu uma criança pequena tendo de buscar água em um poço? Não é uma visão bonita...

-Qual é a mensagem? Você teve uma infância infeliz, e por isso devo ter pena de você?

-Não. Eu apenas estava testando se você cairia nessa.

-Contrário ao estereotipo, príncipes não são burros.

-Isso é chocante. Vivendo e aprendendo!

-O que você quer?- exclamou Wilson, frustrado. -Não tem nenhum roubo para planejar?

-Já planejei roubos demais. Mas é a primeira vez que tenho membros da família real em minha humilde morada.

-Ah, claro! Nós somos seus novos experimentos!

-O que quer dizer com isso?

-Uma pequena aposta que tenho com Cameron. Aliás, vou preveni-la sobre sua infância triste! Porque vê...ela cairia neste truque! Não que não seja inteligente, mas é ingênua. Acha que você leva esta vida por carência, para chamar a atenção... Eu discordo. Na minha opinião, você utiliza o crime como um jogo. Quer ver o que consegue fazer, o que não consegue. Quais são seus limites. E é por isso que apesar de todo o dinheiro que roubou, você não tem um esconderijo fixo e vive em tendas de campanha! Não quer melhorar de vida, porque aí acabariam as emoções. É isso que eu e Alisson somos, não? Emoções novas? Seres humanos diferentes para você estudar, conhecer e devolver?

-Sua perspicácia é excelente.

-Não conte comigo. - Declarou o príncipe, levantando-se e se afastando de House que, sorrindo ironicamente, o seguiu para fora da tenda.

-Devo então entender que quer ficar aqui por um tempo?

Wilson fitou-o com raiva.

-Você me entendeu!

-Entendi. Você não pretende dar-me a satisfação de conhecê-lo melhor. Bem, então terei de partir do que já sei... Você se sente atraído por garotas carentes, e perde o interesse nelas após salvá-las. Isto indica que apesar da fachada gentil que conquista a todos, você não se importa realmente com elas, e está somente tentando satisfazer suas próprias necessidades. Em outras palavras, você não é o Príncipe Encantado dos sonhos, apenas um outro troll que as usa e joga fora.

-Você nem me conhece, como é que...

-Você também não me conhece! No entanto, foi extraordinariamente preciso na análise dos meus motivos para roubar, ainda há pouco!

-Mas eu estava certo, e você está me...

-Estou lhe dizendo a verdade, e devo ser a primeira pessoa a fazer isto! Acorde, alteza, a única diferença entre nós dois é que eu não sou hipócrita!

Wilson abriu a boca para responder, mas estava indignado demais para poder falar. House observou-o por alguns instantes, depois correu o olhar pelo acampamento e percebeu que todos haviam interrompido suas atividades e estavam assistindo à briga.

-O show acabou!- gritou ele, e lentamente seus comandados retornaram às ocupações usuais. O príncipe continuava parado no mesmo local, agora aparentemente envergonhado por ter sido ouvido. House aproximou-se e disse, em um tom de voz mais baixo.

-Já que respondeu à minha pergunta, é justo que eu responda à sua. Quando eu tinha 16 anos me apaixonei por uma moça chamada Stacy. Tivemos uma briga após o incidente que inutilizou minha perna. Arrependi-me e tentei voltar, mas ela não quis. Então invadi seu quarto e roubei seu diário. Foi meu primeiro furto, e também uma intromissão imperdoável na intimidade de uma dama que confiava em mim... Mas ao menos eu não lhe dei motivos para pensar que casaria com ela, e desapareci depois.

Ele se afastou, e Wilson retornou à sua tenda, tremendo de ódio. Quem aquele infeliz pensava que era, para falar com ele assim?!?!? Um bandido, um fora da lei sem a menor consideração por outros seres humanos, um...

Mas enquanto xingava House baixinho, uma voz perversa surgiu em sua mente, sussurrando: “mas ele não deixa de ter razão, você sabe...Seu comportamento para com Bonnie não foi nada principesco! E Julie... Ah, não me faça lembrá-lo do que fez com Julie...”

-Está bem. Talvez eu não tenha agido bem com elas. Mas eu não fiz de propósito! Minhas intenções eram as melhores possíveis!- disse a si mesmo, com convicção.

“Isso está muito bem como desculpa para a primeira vez em que o fez” respondeu sua irritante consciência. “Mas depois da décima, você deveria se conhecer o suficiente para não entrar mais nesta situação. House tem razão, você é um hipócrita...”.

-Essa é boa! Não vou agora começar a me questionar por causa do que disse um bandido de marca maior!

“Bandido ou não, ao menos ele é honesto sobre sua própria natureza. Isto é algo raro, e mesmo admirável...”

-Ele seqüestrou a Alisson!

Isto pareceu pôr fim à discussão. Aliviado, o príncipe atirou-se sobre a cama, exausto. Porém, antes de conseguir dormir, ouviu do lado de fora da tenda a voz zombeteira de seu inimigo.

-Princesa... Já lhe contei sobre a vez em que Lucas arruinou o roubo perfeito porque não conseguiu dizer a uma dama que eram nove da noite sendo que eram dez?

Wilson pôde imaginar com clareza a expressão embaraçada do rapaz ao ouvir essa história sendo repetida a uma bela moça e, odiando a si mesmo por isso, não conseguiu reprimir um risinho.

No castelo, as coisas iam mal. As buscas não haviam revelado nada, os reis de Candylot estavam demasiadamente estressados para conseguir se concentrar, e Cuddy e Foreman haviam, portanto, assumido o comando das investigações.

A rainha, apesar de perturbada pela gravidade da situação, estava em seu elemento. Era uma exímia governante, de capacidade sem paralelo, e decidida a jamais desistir de um objetivo antes de atingi-lo.

O conde, porém, não estava em uma situação tão confortável. Por mais que lamentasse, a verdade é que não era muito bom em nada que envolvesse se relacionar com outras pessoas. Sentia saudades da princesa, afligia-se em pensar no que poderia estar acontecendo com ela... Mas não conseguia entrar nas mentes dos envolvidos, imaginar como o bandido de olhos de safira entrara no castelo, ou que perguntas fazer aos castelãos para tentar desvendar a verdade.

E, acima de tudo, não conseguia interrogar Rèmy.

A bela criada da princesa fora considerada uma testemunha chave, por ter sido a última pessoa a falar com ela. Ao ser questionada, porém, mostrava-se lacônica. Narrava os fatos, sem expressar as próprias opiniões, não porque não as tivesse, Foreman tinha certeza, mas porque simplesmente não estava acostumada a se abrir com outras pessoas. Ele podia se identificar com ela neste ponto... E isto não tornava sua mudez menos frustrante.

-Então Cameron estava perfeitamente normal?

-Sim.

-Ela não disse nada fora do comum?

-Não. Estava rindo a respeito de uma discussão com Wilson. Nada mais.

-Certo. -Suspirou ele, decidindo dar um passo arriscado. -Rèmy... Como você acha que os bandidos entraram?

Ela fitou-o, surpresa e ligeiramente ofendida.

-Como é que eu poderia saber?

-É claro que não poderia. Perguntei sua teoria... De certo tem uma. Você me parece uma moça inteligente...

-Agradeço o elogio, mas não vejo como possa dizer isto. Mal nos conhecemos.

Suspirando fundo mais uma vez, ele a deixou ir. Qual seria o problema com aquela garota?!? Por que estava sempre tão na defensiva? Ela tinha algum segredo, isto era certo... Mas por mais que desejasse descobri-lo, agora não era momento para isso. Ele tinha que se preocupar com Cameron... E com Chase.

Ele não acreditara quando recebera a notícia de que Robert Chase estava no reino, se encaminhando para o castelo, e que poderia esperá-lo dentro de duas semanas. Conhecera o príncipe há alguns anos, acompanhando seu pai em uma viagem diplomática. Sendo os únicos adolescentes no local, os dois obviamente haviam tentado passar a maior parte do tempo juntos... Apenas para descobrir que não se davam nada bem. Quando as reuniões se encerraram, ele havia retornado a Princetown aliviado, crente de que nunca mais encontraria aquele jovem pretensioso.

E agora aqui estava ele, vindo pretender a mão de sua querida “irmãzinha”!!!!

-É pena que ele chegue justamente agora... -resmungou o conde para si próprio. -Eu adoraria ver Cameron lhe dando o fora.

Uma batida na porta o acordou do devaneio, trazendo-o de volta à sua difícil realidade. Os soldados não encontravam nenhum sinal dos bandidos, os súditos não haviam visto nada, Chase estava a caminho, Rèmy estava muda... E ele estava extremamente estressado.

E desta forma, passaram-se duas semanas.
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