Aug 18, 2010 11:31
Certas pessoas tem esse prazer convulsivo por demonstrar seus problemas em público, como forma desesperada de chamar atenção. Elas exprimem sua dor dramaticamente, aos urros como a pedir o ar da ribalta em suas infecções, em seus cânceres. Lá está a senhora Capitulina, a reclamar do peito. Geme, dolorida, tentando mudar os focos da conversa para a sua direção. A outra pode ser a mais bonita, mas a que será abanada e quem sabe até, glória, carregada, será ela.
Mãos ao peito, revira os olhos trêmulos, pede a mão de alguém, fala ao filho, agora atento, que o ama e não quer perdê-lo. Blá, blá blá de leito de morte.
Com o circo armado no meio do parque o filho separa-se da esposa segurando as mãos da mulher que "o gerou com o próprio sangue e que não quer morrer naquele lugar sem seu pobre e amado filho". A vizinhança se acumula ao redor da senhora, querem chamar uma ambulância, mas ela "melhora".
Mais tarde enquanto a senhora Capitulina escorria o macarrão aos assovios, tira do meio do decote de rendas entre os seios murchos da idade que tem o dinheiro que ganhara inda agorinha do filho para os remédios, pensando em como seria terrível não ter dinheiro pra jogar no cavalo, depois do sonho que teve naquela noite, e que o dinheiro que o outro mandava nunca dava pro cigarro e pro jogo. Colocou-o ao lado do cinzeiro, e numa tragada deu mais uma mexida no molho de beringelas, pensando que o filho bem poderia ter namorado uma mulher mais rica. Menos sonsinha.
A pontada foi tão forte que fez com que ela perdesse o equilíbrio, e até a visão se embaçou. Não conseguiu berrar, o cigarro voou pelos ares, a panela de molho emborcou pelo fogão molhando-lhe a camisola de chita. Capitulina caiu sobre os braços, de mal jeito, a respiração faltando, o coração explodindo.
Sem platéia, sua respiração foi abandonando o corpo numa poça de molho de tomate pronto requentado.
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