Mar 19, 2012 21:08
Não conheço bem os meus vizinhos da Cave Esq.ª. Sei que são um casal de idosos, têm uma cadela de pêlo preto comprido e brilhante e têm um pequeno pátio nas traseiras, que vejo quando estendo a roupa. São discretos e reservados, embora polidos no trato. Ele sai normalmente de manhã cedo, para ir ao pão, comprar o jornal e passear a cadela. Também é responsável por colocar o caixote do lixo lá fora, e recolhê-lo. Respondem ambos aos meus bons-dias, ela afável, a querer sorrir, ele também educado, mas mais tímido e esquivo. Sei nada mais que isto, mas é por causa deles que as molas cá em casa serão sempre vermelhas. Isto sucede quase desde o primeiro mês que para aqui vim, há um ano e pouco. Numa dessas noites, ao estender a roupa, deixei cair uma toalha lá abaixo. Dias depois, ganhei coragem e bati-lhes à porta. Não só tinham apanhado a toalha, como me a entregaram dobradinha, impecável. A senhora ainda acrescentou, docemente: "Ainda por cima é de boa qualidade, tirei-a logo para não se estragar com este tempo, era mal empregada". Em seguida, pediu-me para aguardar um pouco. Fiquei à porta. Regressou passados instantes, com um saquinho de plástico. Lá dentro, umas quatro ou cinco molas vermelhas, das minhas. Agradeci-lhe o gesto. A partir daí, de vez em quando, ao abrir a caixa do correio, fui sempre encontrando uma ou outra mola (que volta e meia deixo cair). De modos que é raro comprar, porque quase todas retornam a casa. Mas quando o fizer, serão vermelhas.