[Fanfic] Caminhos

Feb 26, 2010 15:37

Não entendo como nunca achei algo de BrasilxAngola na net quando este é um casal tão historicamente possível. Talvez eu não tenha procurado direito...

Só para avisar, aqui vou usar minha O.C. Márcia para representar Angola. Talvez, quando eu tiver menos preguiça, eu a desenhe e poste aqui.



Caminhos

Márcia nunca havia parado para pensar no quanto a independência de outra nação poderia alterar na sua vida. Na verdade, raramente parava para pensar em outras nações. Por isso é que tudo aquilo era tão estranho.

Nas últimas décadas tudo acontecera no mundo. As colônias inglesas rebelaram-se, mostrando que era possível uma colônia andar com as próprias pernas. Na Europa a Revolução Francesa passou como um caminhão por cima de todas as ideologias preexistentes, inundado a mente de todos os povos com o grito liberté, égalité, freternité. Só que a palavra “liberdade”, que andava estremecendo os corações de júbilo, ou de medo, ao redor do mundo, não tocava o coração de Márcia, pois era algo que nunca antes havia lhe faltado. Bem... Tinham aqueles portugueses que um dia chegaram, criaram fortes em suas praias e diziam a ela que agora fazia parte do grande Império Luso. Mas ela não dava muita bola. Estava ocupada demais com as constantes guerras contra povos visinhos, e os portugueses, ocupados demais com suas terras do outro lado do Atlântico.

Suas terras do outro lado do Atlântico...

Diferente dela, os gritos de liberdade ecoaram por todos os cantos dessa terra. Agora, em meio de circunstâncias que ela desconhecia, o conjunto de terras que se autodenominava Brasil declarou independência da metrópole lusa. Havia tantas outras noticias tão mais importantes que, ao chegarem ao ouvido de Márcia, logo saíram pelo outro. Porem, quando soube desse acontecimento, sentiu que as coisas iriam mudar.

E isso a preocupou.

O que era muito estranho.

Porque ela raramente parava para pensar no que acontecia com outras nações. Mas nesse dia em especial, se encontrava inquieta em sua casa, andando de um lado para o outro com a testa franzida e os olhos intensos circulando entre o chão e a janela de onde se podia ver caravelas trazendo possíveis noticias no horizonte. Acontece que a única ordem vinda de Portugal que ela (até certo ponto) obedecia era nunca fazer comércio com quem estava fora do Império Luso. O que significava que, tecnicamente, não poderia mais ter nenhum tipo de contato com seu irmão.

Seu irmão...

Por um momento, Márcia parou. Seus olhos foram perdendo a intensidade até que tivesse o rosto coberto de melancolia. Quantas vezes ela o havia visto em toda sua vida? Contou com os dedos de uma mão. Fechou os olhos. Tentou se lembrar do dia em que se conheceram. Sim, ela já era uma menina crescidinha naquela época, uma pequena guerreira conhecida das estratégias e das lâminas de aço. Foi por isso que ficara tão surpresa quando aquele garotinho disse ser seu irmão. Não pela noticia em si _ Portugal já havia comentado algumas vezes que ela tinha um irmão mais novo além do mar _ mas pelo seu sorriso. Naquela terra onde impérios inteiros surgiam e desmoronavam em um piscar de olhos nunca alguém havia lhe dado um sorriso como aquele.

“Um sorriso iluminado!”

Foi o que ela pensou naquele momento. Um sorriso iluminado como o sol, como a luz dos vaga-lumes, como o cobre e o ouro que vestia Oxum e como as cristas das ondas de Iemanjá. E ela não teve reação quando viu que aquele sorriso era para ela. Que aquela felicidade em seus olhos era por vê-la. E quando ele começou a falar atropeladamente, como se eles fossem irmãos dês de sempre. E ela desejou que sim, que eles tivessem nascido juntos e crescido juntos e que o Atlântico Sul nunca tivesse existido. Era a mesma coisa todas as poucas vezes em que se encontravam. Não importava quanto tempo havia passado ou o quanto os dois mudavam nesses intervalos, as conversas, os gestos eram de dois irmãos que acordavam e dormiam sob o mesmo teto todos os dias de suas vidas.

Mas agora ele não estava ali.

E ela não podia fingir que a história era assim. Logo ela, que aprendera com sua mãe a ser guerreira, a lutar pelo que era seu e nunca se anular diante da vontade alheia, era obrigada a esperar. Suportar o peso de toda aquela angustia enquanto as caravelas com suas enormes velas brancas vinham em direção do porto, talvez trazendo as respostas pela qual tanto ansiava.

E isso a deixava pra morrer.

Márcia imaginava as tantas coisas que poderiam mudar daquele dia em diante. Pensava em seu irmão Luciano. Entrelaçava os dedos de suas mãos ansiosas. Esperava...

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Dezenas de marujos corriam pelo cais do porto segurando cordas, recolhendo velas e preparando o desembarque dos tripulantes que chegaram em três grandes caravelas. Enquanto isso, Márcia andava de um lado para o outro, tal qual uma leoa impaciente esperando que a presa saia de sua toca. Já tinha decidido. Não importava quem é que fosse que sair daquele barco, ela iria encurralá-lo e só o largaria quando tivesse suas respostas. Foi quando armaram a escada de desembarque e de lá surgiu a ultima pessoa que ela esperava ver.

“Marcinha!!”

E com esse grito Luciano desceu as escadas em um pulo, correu em sua direção e a abraçou, dando-lhe um beijo na testa.

_ Lu-Luciano... _ Ela demorou uns segundos para processar a informação. _ Luciano!!! Que diabos você está fazendo aqui?! Disseram-me que tinha acabado de ficar independente! Que tipo de país fica independente e já sai por ai perambulando na casa dos outros?! E... E dês de quando você é mais alto do que eu?!

_ Bom dia para você também. _ Disse Luciano lentamente, como se tentando ensiná-la a falar. _ Sim, eu fiz uma boa viajem vindo até aqui, o vento estava bom, e também senti sua falta.

_ Não fale assim comigo. _ Respondeu em tom de censura. _ Sou sua irmã mais velha! É meu dever me preocupar com você e querer saber de todos os detalhes de sua vida!

Luciano riu. Uma risada tão gostosa que foi difícil para Márcia manter o semblante sério. Ele a abraçou mais uma vez e depois voltou a falar.

_ Sim, eu declarei independência a pouco tempo, mas já resolvi todos os problemas no sul e no norte, embora a situação na Bahia ainda esteja complicada. Realmente minha casa precisa muito de mim agora, mas antes... _ Ele deu uma pausa, olhou para o chão, respirou fundo e quando voltou a fita-la nos olhos, levava uma expressão séria no rosto. _ Eu tenho que falar com você.

Algo naquele rosto a espantou. Foi como se, naquele instante, seu irmão tivesse envelhecido anos. E ela não estava acostumada com ele se dirigindo a ela nesse tom formal.

_ Mas não aqui. _ Continuou Luciano. _ Seria incômodo se fossemos para sua casa?

_ Ah. Não. De jeito nenhum, por favor, venha.

Os dois seguiram em silêncio a estrada que levava até a casa de Márcia. Por todo o caminho, ela entrelaçava os dedos, mexia no cabelo, mordia os lábios, revirava os olhos, tamanha era a ansiedade que inquietava seu peito. O que seu irmão queria com ela em um momento tão agitado? Declarar independência não devia ser fácil... O pouco que se lembrava das histórias que ouvira era cheio de batalhas, mortes e execuções. Seu irmão havia passado por tudo isso? Será que estava ferido? Virou a cabeça para checar seu estado. Olhando assim, superficialmente, ele lhe parecia saudável... Bem saudável... E bonito também... Agora que havia parado para notar ele não estava apenas mais alto que da ultima vez, também parecia mais... másculo?

_ Marciiiiinha! _ Foi o que ele disse, com um sorriso, ao notar que a irmã o observava.

Márcia enrubesceu, virando o rosto rapidamente.

_ Vamos logo! Do jeito que você é deve estar morto de fome.

“Ta, ele não está assim tão másculo...”

Chegando em casa, ela foi logo para a cozinha, preparar alguma coisa para ele comer, mas...

_ Ah! Não estou com muita fome agora. Me traz só um pouco de água pra depois a gente conversar.

Como assim? O Luciano que ela conhecia sempre entrava na casa dela e corria logo para a cozinha. Abria todas as panelas e ia logo enchendo o prato sem nem pedir licença. Não só isso, enquanto comia com o rosto oculto atrás da montanha que se formava em seu prato ia dando sugestões entre uma garfada e outra do que ela poderia preparar para a janta.

Toda essa repentina mudança na atitude de seu irmão já estava deixando preocupada.

_ Está bem. Quem é você e o que você fez com o meu irmãozinho?

Luciano respondeu com uma risadinha. _ Mas agora sério. Tenho que falar com você.

MUITO PREOCUPADA

_ Ah... Está bem. Deixe-me pegar sua água.

Ela foi para um canto da sala. Pegou uma jarra de água fresca, serviu em um copo e levou ao irmão. Ele agradeceu, bebeu tudo em um único gole e permaneceu parado por alguns instantes, fitando o nada com uma expreção que era muito estranha para Márcia. Depois foi à mesa no canto da sala, colocou o copo no lugar, voltou e olhou a irmã nos olhos de maneira incisiva.

_ Você sabe que agora que eu não sou mais território português você não deveria mais se encontrar comigo não?

Márcia sentiu seu coração doer e, por um momento, quis desviar daquele olhar.

_ Então eu vou logo ao ponto... _ Luciano segurou suas mãos e deu uma pausa para respirar fundo.

“Eu quero que você se case comigo!”

Foi o que saiu dos lábios de Luciano. Dizer que aquilo pegou Márcia de surpresa não seria verdadeiro. Aquilo foi muito mais do que inesperado. Como ela deveria reagir nessa situação? Ela abriu a boca, tentando balbuciar alguma coisa. Qualquer coisa. Mas antes que ela conseguisse organizar as palavras, Luciano tornou a falar.

_ Nós dois sabemos que o seu comércio com Portugal é mínimo! Quase todos os negócios que você tem no exterior são comigo. Aliais minha economia também ia sentir muito se a gente cortasse relações e essa é certamente a ultima coisa que eu preciso no momento. Desse ponto de vista você deixar Portugal para ficar comigo é a melhor opção para nós dois. Eu sei que ele não vai te deixar ir assim, sem fazer nada, mas eu te ajudo! Ele não está em condições de brigar com ninguém, é a melhor hora para tentar a independência. Eu sei que você não pensa muito nisso porque ele não te chateia muito, mas assim como ele começou a me explorar quando perdeu as Índias ele deve começar a colonizar você e Moçambique mais efetivamente e saiba que não é nem um pouco legal ser uma colônia de exploração e... e... _ Depois de minutos falando sem nem uma pausa para respirar Luciano se perdeu nas palavras. Olhou a sua volta como se tentasse achar o fio da meada voando ao redor de suas cabeças. Depois olhou para Márcia e em seguida, com um olhar triste, voltou-se para os próprios pés.

_ Eu não quero ficar sozinho... _ Murmurou em tom choroso. _ Onde eu moro todos os meus visinhos me estranham... Por favor... Por favor, fica comigo Marcinha...

Aquela ultima suplica... Em poucos instantes Luciano voltou a ser uma criancinha, como era da primeira vez que se conheceram. Mesmo assim, as mãos que esmagavam seus dedos naquele momento eram muito fortes. Ele ainda olhava para o chão. Ela, muda, olhava seus para seus dedos por entre as mãos do irmão. Dedos calejados pelas constantes guerras. Estava acostumada com a guerra. Mesmo assim, a idéia de lutar contra uma nação Européia, com seus canhões e armas de fogo, assustava. Mesmo que Portugal estivesse fraco, mesmo com a ajuda de seu irmão... Desde sua mais antiga lembrança Portugal já estava lá. Antes mesmo dela nascer, sua mãe já o conhecia. Acabar com uma relação de mais de 300 anos não era fácil. Especialmente sendo uma relação que nunca havia lhe incomodado muito.

Os dois ergueram a cabeça ao mesmo tempo. Márcia olhou bem nos olhos perdidos de Luciano e ele nos olhos temerosos de Márcia. Ficaram um tempo assim, de mãos dadas, quando Luciano deixou sair um suspiro. A tristeza foi sumindo de seus olhos e foi dando lugar a um sorriso de compreensão.

_ É claro que você não precisa responder agora. _ Ele largou as mãos da irmã e afagou seu rosto. _ Mas pensa nisso com carinho ta? _ Deu um beijo em sua bochecha, seus lábios eram muito quentes e macios, e foi em direção da porta.

_ Acho melhor eu ajudar o pessoal a desembarcar tudo do navio. _ Disse com um sorriso. _ Quando voltar quero uma coisa bem gostosa para eu comer! Se eu vê comida de navio na minha frente mais uma vez eu vomito.

Ele saiu pela porta, tomando o caminho de volta ao porto. Márcia correu até a janela para observar o irmão ir embora. Vê-lo assim, declarando independência, tomando decisões, fazendo propostas, virando criança e depois se recompondo... parecia que ele era muitos, muitos anos mais velho que ela.

E ela se perguntou sobre onde ela estava nesses últimos anos da vida de seu irmão...

... e onde ela estaria nos próximos...

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Em 29 de Agosto de 1825, um acordo de reconhecimento da independência do Brasil é assinado por Portugal. Uma das condições do reconhecimento: O Brasil não poderia levar consigo nenhuma outra colônia portuguesa. Fora isso, o comércio entre ele e as colônias africanas não sofreu nenhum tipo de grande alteração.

E Angola nunca pode dar uma resposta.

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*pouco depois de conseguir independência, o Brasil mandou vários folhetos para Angola, chamando os angolanos para unirem-se a eles na independência e formarem um reino unido. A verdade feia por traz disso tudo que eu preferi ignorar na fic foi que o motivo para os dois terem pensado em se unirem ter sido o intenso tráfico de escravos entre os dois :( Dizer isso na fic a estragaria totalmente, mas me sinto como se estivesse enganando alguém ao omiti esse detalhe. Por isso o inclui aqui embaixo, bem pequenininho...

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