Eu já consto da base de Dadores de Medula Óssea, e tu? :)

Jan 10, 2013 17:48

Ontem fui fazer uma coisa que há muito queria fazer, sendo até uma das minhas resoluções (mentais) para 2013 - fui inscrever-me no Registo de Dadores Voluntários de Células de Medula Óssea. Algo tão simples como isto, e que me fez sentir mesmo muito bem.

É normal vermos diversos apelos no Facebook, por email ou outros, de pessoas que estão numa situação tal que somente com a doação de Medula Óssea poderão sobreviver. Quando não é connosco é fácil não nos deixarmos afectar profundamente por isto, mas aquilo fazia-me confusão, principalmente em crianças pequenas, e no geral, porque são doenças tramadas, que não aparecem por existirem comportamentos de risco e estão famílias a sofrer à espera de algum "milagre" que outra pessoa em qualquer parte do mundo lhes pode dar. E quem me diz que um dia não sou eu ou alguém que me é querido?...

Qual a dificuldade para mim em inscrever-me como dadora e proporcionar isso a alguém? Acreditava que não era nenhuma e se alguma vez tiver oportunidade de fazer de facto a doação, acredito que será uma sensação fantástica a de ajudar a salvar uma vida! Já imaginaram?!

Durante esta semana tirei algumas dúvidas que tinha pela Internet (it's all there...), principalmente acerca do processo da extracção da medula, pois era a parte que me fazia alguma confusão (sim, sou uma maricas no que envolve dor - o que não se aplica verdadeiramente neste caso, acredito que apenas algum desconforto). Decerto muitos de vós não estarão a par de todo o processo, e os que estão, acredito então que já estejam  inscritos como dadores :)


(o que estiver a itálico é tirado de uma das fontes listadas no final, o que não estiver sou eu a escrever)

Mas afinal o que é a medula óssea?

A medula óssea é um tecido esponjoso que preenche o interior vários ossos, como os da bacia. É nesse tecido que existem células progenitoras, ou seja, com capacidade para se diferenciarem e dar origem a qualquer célula do sangue periférico, as chamadas stem cell dos autores ingleses ou células progenitoras/estaminais, em português. Estas células renovam-se constantemente mantendo um número relativamente constante em qualquer momento.

Apesar de genericamente se falar de transplantação de medula óssea, de facto o que se faz é uma reinfusão ou transfusão no doente de células progenitoras retiradas da medula do dador. Estas células saudáveis vão substituir as células doentes e são responsáveis pela formação de novas células saudáveis. Mas para que o transplante tenha sucesso, as células saudáveis devem ser o mais possível compatíveis com as células do doente.

Quem se pode inscrever como dador, quais as condições necessárias?
  • Ter entre 18 e 45 anos;
  • Peso mínimo de 50kg;
  • Altura superior a 1,5m;
  • Não ser portador de doenças crónicas ou autoimunes;
  • Nunca ter recebido transfusões após 1980.
Onde nos podemos inscrever?
Existem vários locais de inscrição spalhados pelo país, no entanto é nos Centros de Histocompatibilidade, localizados no norte, sul e centro, responsáveis pela gestão dos dadores, que devemos (se não encontrarmos) pedir informações acerca dos locais onde nos poderemos registar como dadores (eu fui ao Centro de Histocompatibilidade do Centro).

O que acontece quando nos vamos inscrever?
Inicialmente preenche-se esta ficha de inscrição, que explica o processo de doação e tudo o que está envolvido. Inclui um pequeno questionário clínico com informação a preencher pelo dador, acerca de doenças e comportamentos de risco. (À partida julgo que ninguém estará excluído se cumprir as condições para ser dador, no entanto se se designar factores de risco neste questionário, acredito que poderá ser negado, mas não o posso confirmar.)

A senhora que me atendeu (médica?) respondeu prontamente às minhas questões, embora eu já tivesse feito a minha pesquisa (já tinha lido o pdf do questionário previamente). Após o preenchimento da ficha, fomos para outra sala, onde a técnica me retirou um pouco de sangue, tal e qual como quando vamos fazer análises. Nesse sangue apenas são analisados os genes - em linguagem técnica: são analisadas as características tecidulares dos leucócitos, a chamada tipagem HLA, dados a figurarem na minha ficha de dadora, dados esses a cruzar com possíveis receptores.

São estas características que vão permitir avaliar a compatibilidade entre mim, como potencial dadora e o doente (receptor), antes deste poder vir a receber a medula óssea.A ficha de inscrição menciona que são feitos testes virais à colheita de sangue que fazem neste primeira etapa, mas de momento tal já não acontece, por redução de custos (disseram-me elas)! No entanto, não é de todo ilógico, pois se algum dia formos chamados por existir uma hipótese de compatibilidade com um doente, é colhido novamente sangue para análises mais profundas, e se porventura não se era portador de alguma doença viral, no futuro pode vir a acontecer, e nessa nova colheita far-se-ão todas análises necessárias.

Após a colheita de sangue, fica-se assim automaticamente a integrar a Base Nacional de Dadores de Medula Óssea (CEDACE) e a Base Mundial: BMDW, Bone Marrow Donors Worlwide, onde ficam registados os nossos dados pessoais e tipagem HLA.

Citando o passo seguinte, que pode ou não algum dia vir a acontecer:

Se o doente não tiver um dador familiar compatível é iniciada uma pesquisa aos registos de dadores. Assim que é identificado um potencial dador compatível, este é informado e, caso aceite, vai prosseguir o processo. Nessa altura o dador vai ser chamado para fazer testes adicionais de compatibilidade, bem como uma nova avaliação para doenças virais que possa ter tido no espaço de tempo entre a inscrição e a chamada. É este o passo a que chamamos a activação do dador. (o que mencionei anteriormente)

Se a avaliação de todos os resultados laboratoriais continuar a considerar o potencial dador como o mais indicado, este vai ser submetido a um exame médico completo e no qual onde pode ainda esclarecer quaisquer dúvidas que tenha sobre o processo de dádiva. Nesta fase o dador deve estar absolutamente certo da sua decisão de fazer a doação e é-lhe então pedido para assinar um impresso de consentimento informado. A partir desse momento o doente começará a fazer a preparação para a dádiva de células de medula.

Perguntei por estatísticas. Ela disse-me por alto acerca da região centro apenas, a qual ela geria e acompanhava os dadores. Em 2012 surgiram-lhe cerca de 300 casos de compatibilidade, mas apenas cerca de 20 foram mesmo dadores, pois verificou-se a tal semelhança perfeita. É um número baixo, pois somos todos geneticamente muito diferentes, mas por vezes consegue-se, por isso é que é tão importante esta base de dados crescer, para as probabilidades aumentarem. Neste momento, as estatísticas apontam que para 80% dos doentes há um dador compatível.

E quando acontece esse milagre....

Como se processa a colheita de células de transplantação óssea?

Existem dois processos de colheita de células para transplantação de medula:
  • Colheita a partir da medula óssea - Células progenitoras colhidas do interior dos ossos pélvicos. Requer geralmente anestesia geral e uma breve hospitalização de cerca de 24h. Não tem riscos para além da curta anestesia a que é sujeito e poderá eventualmente sentir alguns incómodos no local da picada durante um ou dois dias;
  • Colheita de células progenitoras periféricas - Colheita feita no sangue periférico, geralmente a partir de uma veia do braço, através de um processo simples chamado aférese. Neste caso, o sangue retirado da veia do dador passa através de um aparelho que remove apenas as células necessárias para o transplante, devolvendo novamente as restantes células e plasma ao dador. Neste caso
    para que as células da medula sejam mobilizadas para a periferia, é necessário que o dador faça um tratamento com injecções subcutâneas de uma substância chamada factor de crescimento. Este factor de crescimento é uma substância fisiológica que todos nós produzimos diariamente e principalmente quando é exigido ao nosso Sistema Imunitário que responda a uma infecção, por exemplo.
(Além destes dois métodos, existe ainda outra fonte de células progenitoras que são as células do cordão umbilical. Neste caso, após consentimento prévio da mãe, as células são colhidas do cordão umbilical quando o bebé nasce. O cordão umbilical tem uma percentagem muito elevada de células progenitoras mas como a quantidade geralmente é pequena, são utilizadas, sobretudo, na transplantação de crianças.)

O que é qualquer um destes processos para um dador, comparado com o sofrimento de um paciente cuja última esperança é esta transplantação?? Além do tempo (e de algum pequeno desconforto), nada mais nos é pedido (as despesas são todas pagas pelo SNS).

Um dador e um receptor podem estar em qualquer parte do mundo, por isso as colheitas são feitas nas cidades principais de cada país onde estejam localizados os aeroportos, para seguir logo por avião para os doentes. Em Portugal são realizadas em Lisboa e no Porto.

Claro está que uma pessoa que necessita de um transplante deste género já fez todos os tratamentos possíveis (quimioterapia, etc) e esta é a única hipótese de salvar a sua vida.

Pode um dador desistir do processo após saber que é compatível com um doente?
Como voluntário, o dador não tem nenhuma obrigação legal. Um potencial dador com compatibilidade com um doente que necessite de transplante de medula pode, por diversas razões, retirar-se do processo. As decisões individuais serão sempre respeitadas.

Contudo, uma decisão tardia relativamente à desistência pode ter riscos muito graves para o doente. Uma mudança de atitude no final do processo pode ser fatal para um doente que está a fazer preparação para o transplante.

É perfeitamente natural que apareçam dúvidas, hesitações ou mesmo recusas quando um dador é contactado. Mas depois de ponderados os prós e contras, o dador deverá tomar uma decisão e saber que, se for alterada tardiamente, irá afectar não só o próprio mas também o doente.

Quem paga o processo da doação?
Todos os procedimentos médicos que envolvem a doação são cobertos pelo subsistema de saúde do doente, bem como as viagens e outros custos não médicos. Os únicos custos que poderão vir a ser imputados ao dador são os referentes ao tempo que necessita despender no processo de doação.

Só se pode dar medula uma vez?
Não, a medula é um tecido que se regenera rapidamente, pelo que é possível fazer mais do que uma dádiva.

Uma coisa que me esqueci de perguntar e que tenho pena de não ter feito era se sabíamos posteriormente a evolução do doente após a transplantação e se poderíamos ter algum contacto com o mesmo. Acredito que a primeira questão sim, quanto à segunda  já tenho dúvidas...

Então, já apontaram na agenda quando se vão inscrever como dadores? :)

Podem ainda sugerir a deslocação de uma brigada ao vosso local de trabalho.

Fontes:
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