Deixo

Feb 26, 2011 12:46


Eu morri há quase 9 anos. Mas eu não estou escrevendo à vocês para contar como morri. Estou escrevendo para contar como vivi. A história do meu grande amor. E também eu quero dizer que o amor não morre. Até depois da nossa morte. Mesmo se alguém tenta matá-lo, até se você quiser matá-lo. O amor nunca morre...

Nós conhecemos no dia 24 de dezembro, véspera do Natal. Eu estava comemorando com a minha mulher, a terceira, na casa dos nossos amigos. A minha vida era inútil até o aparecimento dela. Eu sempre perguntava a mim mesmo ''Para quê eu vivo? Vivo para o trabalho?'' Sim, eu gostava das coisas que fazia. ''Mas e quanto a uma família?'' Eu queria muito ter filhos, mas eu não tinha. Agora eu entendo que o objetivo da minha vida sempre foi a esperança de encontrá-la. Eu não quero descrevê-la. Melhor dizer que eu não posso descrevê-la, para que vocês entendam melhor como é. Porque cada linha desta minha carta está impregnada de amor para ela. E porque eu daria qualquer coisa por uma lágrima que caísse dos olhos tristes dela.

Então, isso foi na noite do dia 24 de dezembro. Eu percebi, em seguida, que fiquei perdido. Se ela chegasse sozinha, eu não me acanharia. Iria começar a falar com ela no primeiro instante do nosso encontro, apesar de minha mulher estar lá também. Mas ela não foi sozinha. Ela veio acompanhada pelo meu melhor amigo. Ele a conheceu umas semanas antes, mas já havia me falado muitas coisas interessantes sobre ela. Agora eu a estava vendo pela primeira vez. Quando o Natal chegou, às 0h do dia 25 de dezembro, desejamos para todos 'Feliz Natal' e eu fiquei próximo da janela. Quando o vidro ficou embaçado pela minha respiração, escrevi: ''AMO''. E depois que me afastei da janela, a palavra desapareceu.

Bebemos e nos divertimos durante a madrugada festiva. Depois de uma hora, voltei pra janela. Respirei e li ''SUA''. Eu quase caí no chão. Minha respiração vacilou por um segundo. O amor chega só uma vez. E a pessoa entende isso logo seguida. Toda minha vida anterior a esse dia era uma mistura de bobagem e loucura... Existem muitas palavras para descrever isso, mas a verdade é que a minha vida teve um recomeço naquela madrugada de Natal. Eu percebi nos olhos dela que esse dia era o primeiro de uma nova vida para ela também.

No dia 26 de dezembro, ficamos num hotel e fizemos planos para comprar nosso próprio cantinho. Ficou comum escrever as mensagens na janela. Eu escrevia a ela ''Você é o meu sonho'' e ela respondia ''Só não acorde''. Deixávamos nossas vontades mais secretas nas janelas de carros, das casas dos nossos amigos, etc. Ficamos juntos apenas por 2 meses. E depois eu morri.

Agora, eu a vejo só enquanto ela dorme. Me sento ao lado dela em sua cama, sinto o seu cheiro. Eu não posso chorar. Eu não tenho como. Mas eu sinto dor. Não é uma dor física, é uma dor na minha alma. Durante todos esses 8 anos, ela comemorou o Natal sozinha. Ela senta-se perto da janela acompanhada por um copo de champanhe, chorando. Eu sei que ela continua a escrever mensagens nas janelas para mim. Todos os dias. Mas eu não as posso ler pois, da minha boca, a vontade de respirar não se faz suficiente para embaçar a janela.

O Natal passado foi especial. Eu não quero contar sobre os detalhes da vida após a morte, mas eu recebi um último desejo. Eu ansiava por ler uma última mensagem dela. E quando ela adormeceu eu sentei muito tempo em frente a cama dela, toquei os cabelos dela, beijei as mãos dela. E depois fiquei próximo a janela. Eu sabia que iria conseguir, sabia que iria ver a mensagem dela... E eu vi. Ela deixou uma só palavra ''DEIXA''.

Este Natal é último que ela passa com a solidão. Eu recebi esse último desejo em troca de nunca mais voltar e nunca mais vê-la. E às 0h horas...Quando o Natal chegar e as pessoas desejarem feliz Natal para todo mundo, ela ficará próxima a janela e verá a minha resposta: ''DEIXO''.

португальский язык, português

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