La Jetee
França - 1962 - 28 min. - Preto e Branco
Realização e Argumento Chris Marker
Produção Anatole Dauman
Banda Sonora Trevor Duncan
Edição Jean Ravel
Elenco: Jean Negroni...Narrador | Jacques Ledoux...Experimentador | Helene Chatelain...A Mulher | Davis Hanich...O Homem
Este é um dos filmes mais estranhamente belo e triste que já tive o prazer de ver. Os seus curtos, mas certeiros, 28 minutos de duração, deixaram-me hipnotizado e literalmente de boca aberta.
Realizado pelo multifacetado Chris Marker (realizador, fotógrafo, artista multimédia, designer, poeta, jornalista e viajante), La Jetee é uma obra-prima da Ficção- Científica onde o realizador dá ênfase à sua fixação por viagens, imagem, tempo e memória. Um filme à base de fotografia a preto e branco, acompanhada pela narração de uma história sobre viagens no tempo, nostalgia e amor.
Em Paris, numa visita com os pais a um aeroporto, um miúdo vê duas imagens que ficariam para sempre marcadas na sua memória: o rosto de uma mulher bonita e um assassinato, cujo significado só mais tarde compreenderia.
Segue-se a 3ª Guerra Mundial e um holocausto nuclear. Em todo o planeta, a vida para os poucos sobreviventes só seria possível debaixo de terra, numa rede de galerias governadas por alguns homens que se tinham imposto como líderes.
São realizadas experiências/viagens temporais ao passado em homens cobaia para descobrir as causas da guerra/holocausto e procurar sobreviver à destruição a que a humanidade estava condenada.
O miúdo, que entretanto cresceu, é escolhido como cobaia perfeita, por causa da sua obsessão por uma memória de pouco antes da guerra. Após uma série de viagens no tempo, baseadas na sua recriação de memórias passadas, ele apaixona-se pela mulher que tinha visto no dia da visita ao aeroporto.
Terminadas as experiências, que não tinham como propósito alterar o rumo da história, mas aprender com ele, é-lhe dada a oportunidade de viver num futuro pacífico, oportunidade que rejeita para voltar ao passado e à mulher que não se percebe se é uma obsessão nostálgica real ou se existe apenas nos seus sonhos. A sua motivação passional de regresso ao passado leva-o a um fim que lhe era familiar. Tudo o mais que possa ser acrescentado corromperá o prazer de o ver e quanto a teorias, cada um que faça as suas próprias.
Todo o filme se constrói sobre imagens fixas com excepção de um efeito, simples mas intenso, de um sorriso e piscar de olhos da mulher do aeroporto. Nesse momento, nem nós como espectadores podemos estar certos se o que vimos realmente aconteceu.
O som cria o ambiente perfeito e é duma simplicidade arrebatadora. A determinada altura ouvem-se as vozes dos experimentalistas sob a forma de sussuros imperceptiveis, debaixo de um evidente bater de coração do protagonista, referido apenas como “The man whose story we are telling”.
Qualquer semelhança entre este filme e 12 Monkeys de Terry Gilliam não é pura coincidência. La Jette inspirou o filme onde Bruce Willis, Brad Pitt e Madeleine Stowe brilharam em 1995. Enquanto 12 Monkeys se torna mais complexo mas também mais objectivo, La Jetee tem um universo onírico mais forte, onde a história é contada como se fosse um poema. A versão original é em Francês, no entanto a versão em Inglês é igualmente bem conseguida.
Se Chris Marker prestava um tributo subtil ao filme Vertigo (1958), já Terry Gilliam não se acanhou em mostrar uma parte do filme, quando os seus protagonistas estão numa sala de cinema a assistir a uma retrospectiva de Alfred Hitchcock. James Cole (Bruce Willis) na cena do tronco de madeira associa a história das personagens de Vertigo à sua.
No filme Blade Runner (onde a Memoria assume também uma grande importância) Ridley Scott homanageia La Jetee, quando numa cena, a fotografia da “mãe” de Rachel se anima por 1 segundo.
La Jetee pode ser encontrado em VHS, ou em DVD numa edição conjunta com o filme experimental Sans Soleil (1982), também de Chris Marker. Existe também uma compilação de curtas-metragens em DVD chamada Dreams onde nos Extras se podem encontrar entrevistas a Terry Gilliam e a Janet e David Peoples (argumentistas de 12 Monkeys) em que discutem o trabalho de Chris Marker e a importância que La Jetee teve na criação de 12 Monkeys.
Não é um filme fácil de assimilar pela maneira como nos agarra a atenção e nos paraliza os membros. Não é também um filme para se ver num dia qualquer. Mas se estivermos em paz com o mundo, porque não deixar cair uma lágrima daquelas que só saem perante a beleza? E para que o final deste texto não seja lamechas, aviso já que para alguns, é provável que o filme não passe de uma valente seca.