Oct 21, 2009 15:24
Eu sou uma pessoa impressionável. Hoje, angustiou-me profundamente assistir ao Telejornal. Vomita-se diariamente um rol de notícias negativas, tragédias e desgraças, woe is me. Mas depois, quando se aligeira o tom, parte-se para peças de relevância duvidável, como a ligação em directo para acompanhar a fila para a venda de bilhetes para o concerto dos U2. O Telejornal transpira auto-comiseração, mas pior que isso a ignorância deliberada e a inépcia dos Portugueses. Portugal desceu 30 lugares e encontra-se agora no 30º posto do ranking da liberdade de imprensa, a par com o Mali. Fala-se em “retrocesso da liberdade de imprensa na Europa”. Ora, fiquei eu hoje a saber, dezoito anos passados, e mais uma vez cortesia do Telejornal, que José Saramago escolheu o exílio espanhol por uma questão de censura (arrisco a chamá-la assim). Supostamente o “Evangelho segundo Jesus Cristo” foi retirado de um concurso literário (perdoem-me o crime de não poder dar todos os pormenores) por deliberação política. Compreendo perfeitamente a posição tomada por Saramago de engrossar as fileiras do êxodo de figuras da cultura e da ciência do nosso país. Muitas vezes pergunto-me se esta é a solução.Existe uma “solução”?
Já durante os primeiros anos do curso, imbuída do espírito fatalista e pessimista que rodeava a Arqueologia (“ai o mercado de trabalho é uma desgraça”, “ah e escolheste estudar Arqueologia para depois ir para o desemprego?!”) me punha a questão de ficar em Portugal ou tentar a minha sorte lá fora. Até que ponto é egoísta procurar oportunidades no estrangeiro? É altruísta mantermo-nos em território nacional ou regressar mas tarde, depois de um período de formação lá fora, para tentar dinamizar o sector em Portugal? É uma questão de valores?
Para o eurodeputado David ... tudo é valorativo. Ora José Saramago deveria abdicar da nacionalidade portuguesa porquê, apesar de no fundo ele já o ter feito?! Arriscando-me a ser tão demagógica quanto ele, afirmo que seria a um assassino ou um ladrão a quem ele deveria dar conselhos de tal índole. Dizer o que se pensa é uma ofensa ou um crime de tal forma horrendo? Misturar alhos e bugalhos não faz sentido e é denunciador de uma profunda preguiça mental, que o eurodeputado patenteia na recusa à leitura do livro. Pessoalmente, acho desprezível emitir uma opinião sem conhecimento de causa. Abomino-o profundamente.
E depois num registo mais pessoal, custa ouvir uma avó dizer que também condena José Saramago, “porque somos um país católico, e pensar para si é uma coisa, mas escrever num livro é outra”. Portugal será assim, marcado por opiniões muito diferentes, mas é inegável que ainda somos muito tacanhos. O Telejornal só o vem corroborar, mostrou-nos que hoje de manhã o cardeal patriarca de Lisboa, D. José Policarpo esteve com José Sócrates em período de formação do corpo governativo.
Nem todos serão tão impressionáveis quanto eu, mas parece-me difícil ficar indiferente a tais sequências de acontecimentos.
verborreia,
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saramgo