O meu direito de resposta a um artigo do Diário de Coimbra saiu no jornal :o Hahahaha!
SENHOR DIRECTOR,
Não podendo ser indiferente a uma carta que lhe foi dirigida tendo como título “Os putos são como... capitães da malta”, eis que me vejo impelida a tecer alguns comentários ao Sr. Cruz dos Santos e à sua pervertida visão dos adolescentes, à qual também me atrevo a acrescentar truncada e distorcida. Cautelosa e atentamente costumo dar ouvidos aos Velhos do Restelo deste mundo, mas considero que visões apocalípticas não nos deixam sulcar os caminhos que a História há-de percorrer com clareza e justeza.
Começo por dizer que não tenho qualquer reparo negativo a fazer a nenhum dos aparelhos de electrónica que são mencionados. Sou utilizadora da maioria deles e confesso que só me vieram facilitar a vida, tanto no trabalho como nas horas de entretenimento que proporcionam. Percebo, de certa forma, as preocupações das gerações mais experientes (não gosto de lhe chamar velhas, porque velhos são os trapos) quando se deparam com a celeridade a que nos chegam mais e melhores meios tecnológicos ou com o uso impróprio que lhe damos, nomeadamente em locais onde estes não devem ser utilizados. Acredito também que seja difícil de entender certos comportamentos que na adolescência são, acima de tudo, absolutamente normais. Os adolescentes ouvem música que tão incómoda parece ser (a quem possivelmente tivesse como momento musical máximo o festival da canção da RTP), expressam a sua sexualidade, rodeiam-se de maquinetas e vão dispensando a companhia dos pais para se refugiarem no secretismo dos seus quartos. Confesso que não vejo mal nenhum nisto. Eu passei por tudo isto e, chegado o momento em que os ímpetos da juventude são refreados pela lei natural da vida, considero-me um ser humano mais completo e mais experiente.
Julgo que a diferença de há uns 30 anos para cá reside no facto de, hoje em dia, ser aos jovens permitido ter uma personalidade e expressar uma opinião, por mais estapafúrdia e incongruente que seja. Essa mesma ideia poderá amadurecer e tornar-se no alimento da mecânica de um país mais empreendedor e criativo. Ainda que o Sr. Cruz dos Santos atribua culpas, por duas vezes, à emancipação das mulheres não vejo, nem aceito, que tal processo seja nefasto para a solidez da instituição familiar e sua mediação. Pelo contrário. Homens e mulheres percebem agora a importância da partilha de tarefas e da paridade de funções (ainda que não tanto quanto desejável), sendo uma dela a educação dos filhos. A sociedade já há muito “digeriu a emancipação das mulheres” e muito mais batalhas há ainda para travar. Preferirá o adolescente ver uma mãe como um modelo de mulher activa, independente, trabalhadora, senhora de si ou de uma mulher submissa, pouco instruída, mal preparada para os desafios da vida e sujeita às vontades do cônjuge?
Estas transformações não são mais que aquilo que Abril desejou - a liberdade. Poder-se-á contestar que esta liberdade facilmente se metamorfoseia em libertinagem, e até a mim que ainda gozo de uns saudáveis 27 anos alguns adolescentes mais ruidosos causam incómodo. Ainda assim prefiro vê-los aguerridos e aventureiros do que com pensamentos moldados a uma vontade política carregada de moralismos obsoletos. E se tanta gente acusa os adolescentes de consumismo, não vejo como é que eles diferem do resto da sociedade ocidental pós-Segunda Guerra Mundial. Pais, tios, primos, crianças, idosos, solteiros, viúvos estão mergulhados nessa vontade tácita, omnipresente e (sub)consciente de consumir para afagar mágoas e alimentar a alma. No fim de contas, os adolescentes não estão mais do que a repetir o comportamento dos pais, ainda que devidamente filtrando o que consideram supérfluo, ou melhor, o que não é cool.