May 05, 2008 13:36
“Então o apartamento do Uruha pegou fogo” Ruki disse firmemente, mas ainda com um olhar descrente, “porque ele estava tentando fazer alguma macumba?”.
“Não. Era uma terapia, e não tinha nada a ver com macumba. Eu só comentei com o Aoi que deveria ter afastado os maus espíritos do ambiente, aí talvez o incêndio não tivesse começado” Uruha esclareceu, num tom definitivo.
“Ah, tá”, Ruki respondeu sarcasticamente, como se tudo fizesse sentido agora. “Então, agora você vai ficar com o Aoi?” E olhou para Aoi que, no momento, tocava sua guitarra sem dar muita atenção ao resto do grupo. O moreno devolveu o olhar ao se sentir observado.
“É, por mim está tudo bem se ele ficar em minha casa até achar outro apartamento”.
“Isso é estranho” Reita comentou preguiçosamente, largado ao lado de Aoi no sofá.
“Na verdade, não. Coisas assim acontecem todo dia”, Uruha reafirmou. Reita rodou os olhos, e levou o cigarro aos lábios, tragando profundamente.
“Bem, contanto que isso não afete os ensaios. De qualquer forma, você sempre pegava carona com o Aoi mesmo, agora que moram juntos é bem mais prático” Kai concluiu, desistindo de repreender Uruha por seu descuido. Ele sabia que brigar era inútil, o loiro era avoado por natureza.
“Agora que está tudo resolvido” Reita resmungou, tocando uma corda aleatória de seu baixo, o som ecoando pela sala.
“Eu vou levar Uruha até o apartamento, para ver se alguma coisa sobreviveu” Aoi comentou, se levantando e guardando a guitarra. “Vocês não se importam se não ensaiarmos hoje, certo? Quero dizer, acho que é importante passar lá antes que comecem a demolir ou reformar tudo”.
“Claro que não! Talvez o estrago não tenha sido tão grande, Uru-kun”, Kai afirmou suavemente, mas Uruha encolheu os ombros, indiferente.
“Duvido. Aqueles bombeiros eram verdadeiros tapados. Levou séculos para chegarem lá e verem qual dos apartamentos estava pegando fogo. Não tenho um pingo de fé nos serviços públicos desta cidade.”
“Eu não sei por que você não ligou para mim. Você sabe que não me importo que fique no meu apartamento. É maior, e tenho certeza que Aoi gosta de ter privacidade, apesar de insistir que não”.
“Não, obrigado, Kai-kun. Sua comida é uma delícia, mas eu gosto de conseguir passar pelas portas, ou andar sem me cansar nem ter um enfarte.”
“E lá vem ele com a morte de novo” Aoi observou, desinteressado, já pronto para sair do estúdio e resolver o problema do apartamento de Uruha, para finalmente poder dormir um pouco. Isto é, se um certo alguém o deixasse dormir.
“Não, eu só gosto do meu corpo do jeito que é, concorda?”
“É, concordo” Aoi chutou a base da mesa onde se apoiava, impaciente. “Está ótimo do jeito que é, Uruha, você sabe disso. Agora, será que podemos ir?”
“Você acha que estou tentando te engordar?” Kai parecia ofendido, cruzando os braços sobre o peito desafiadoramente.
“Não, eu disse que você não consegue me ver sem me enfiar comida, só isso.”
“Mas você não come nada!”
“Mas cozinha que é uma beleza” Aoi riu, pegado o loiro pelo braço e acabando com a pequena discussão ao arrastar Uruha para a calçada ensolarada, longe de Kai e sua obsessão por comida.
“Ei, eu sei andar sozinho, sabia?” Uruha puxou o braço das mãos de Aoi e limpou uma poeirinha imaginária onde Aoi havia segurado.
“Achei que precisasse de ajuda. Então, pronto pra ver o que sobrou?”
“Vamos?” Uruha estendeu o braço, dando espaço para Aoi entrar no carro estacionado na calçada logo à frente deles.
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“Não está tão... mal...” Aoi tentou suavizar, ao se deparar com os restos do apartamento de Uruha. Eles precisaram brigar para convencer os policiais a deixá-los entrar, porque o prédio havia sido interditado; mas finalmente, depois do choro fingido e das súplicas de Uruha, eles foram autorizados a entrar, mas só para pegar o que havia sobrado e então ir embora. Ele observou a figura pálida de Uruha se mover pelo quarto, que ainda cheirava a fumaça, pegando algumas coisas para olhar, levantando pedaços de madeira para ver se havia algo sob eles. Uruha pegou um porta-retratos, sorrindo mansamente e mostrando-o para Aoi.
“A banda”, ele explicou antes de colocá-lo na bolsa que havia trazido. Aoi sorriu de volta e foi para o que antes era o quarto de Uruha. Ele estivera lá algumas vezes, quando Uruha estava atrasado e ele tinha que apressá-lo.
Onde antes ficavam os tapetes indianos, agora havia somente restos de pano queimado. No lugar da cama, uma enorme e luxuosa cama de ébano, pelo que Aoi lembrava, agora restava apenas um colchão carbonizado e pedaços de madeira queimados ao redor. Era um cenário desolador no quarto escuro e enfumaçado.
Uruha montara um belo apartamento, cheio de coisas exóticas vindas de diferentes partes do mundo. Ele era o que se poderia chamar de um colecionador. Um belo espelho chinês, pintado à mão, ainda pendia à parede; mas o vidro estava quebrado e manchado pela fuligem. A madeira havia queimado e se desprendido da moldura. Como Uruha podia permanecer inalterável diante disso? A cômoda veneziana estava destruída, mesmo os livros que Uruha possuía agora não passavam de cinzas.
Aoi se moveu cautelosamente pelo quarto, indo para um dos cantos, onde ainda havia um pouco de luz. Ao afastar pedaços de madeira, papel de parede queimado e cacos de um vaso despedaçado, ele encontrou uma das guitarras de Uruha, arruinada. Ao pegá-la, notou que o pescoço estava quebrado e as cordas, partidas; e mal se podia imaginar que o instrumento fora branco, um dia.
Enquanto observava o instrumento quebrado, Aoi ouviu um som abafado, vindo do cômodo onde Uruha devia estar naquele instante, procurando algo que tivesse escapado do fogo. Cuidadosamente, devolveu a guitarra ao lugar em que a encontrara, mesmo sabendo que já não havia chances de restaurá-la. Havia sido um belo instrumento, e seria rude maltratá-lo ainda mais que o fogo já havia feito.
Aoi espiou pela abertura onde antes ficava a porta, e viu Uruha segurando um objeto que parecia uma caixa, obviamente chorando. Ele mal podia distinguir algo no apartamento, tudo estava queimado ou chamuscado, ou em cinzas. Uruha apertou a caixa contra o peito e lançou um olhar perdido à sua volta, o lábio inferior tremendo levemente enquanto observava os destroços.
“Uruha” Aoi chamou a atenção do outro, suavemente. Uruha teve um sobressalto, limpando rapidamente as lágrimas do rosto.
“Sim?” E sua voz ainda soava incerta, enquanto colocava a caixa sobre a mesa próxima a uma das janelas.
“Eu achei... uma das suas guitarras” Aoi disse, nervosamente. Ele nunca havia visto Uruha chorar, nunca o vira triste, na verdade, e era um pouco desconcertante vê-lo assim. “Mas está arruinada. Você achou mais alguma coisa?” Aoi olhou por sobre o ombro do loiro, tentando ver melhor a caixa atrás dele. A mão de Uruha cobriu a caixa num gesto protetor, escondendo-a.
“Nada importante, só uns filmes, cd’s e roupas que eu tinha comprado na última turnê e esquecido num canto do guarda-roupas”. Era possível notar que a voz de Uruha estava anasalada enquanto ele falava.
“Ah” Aoi imaginou por que Uruha tentara esconder a caixa dele. Parecia algo importante para o guitarrista, ou ele não choraria ao vê-la. Ou talvez ele estivesse chorando pelo apartamento, não querendo parecer tão desapegado de tudo. Uruha era complicado nesse sentido e Aoi achava que nunca o compreenderia. “Então ponha tudo na bolsa para sairmos logo daqui, é meio assustador”.
“Eu só acho um pouco... abandonado” Uruha comentou suavemente, enquanto tirava as roupas do closet, que parecia quase intacto, e as colocava na sacola que havia trazido. “Eu consigo achar outra casa, e essas são apenas coisas materiais”.
“Claro, mas com certeza elas guardam algum significado para você”.
“Na verdade, não. Elas podem ser substituídas. Você achou mais alguma coisa?”
“Só isso”. Aoi tirou um longo cordão prateado do bolso e o entregou para o guitarrista, que imediatamente o colocou no pescoço, limpando os restos de cinza da peça.
“Presente do Ruki. É bom que tenha sobrevivido. Prova a graciosidade escondida dele”
“É bonito”. Aoi comentou, estendendo a mão para tocar o pingente azul peso ao cordão, roçando levemente a pele sob ele, sem querer. Uruha sorriu e levou a mão ao pingente, assim que Aoi retirou a sua. “Eu não sabia que Ruki era tão doce”.
“Ele é, quando quer. Ele me disse que foi porque consegui passar um ano inteiro sem acabar com um caro. Mas isso foi obra sua, já que resolveu me dar carona para os ensaios”.
“Isso porque seu carro... hã... seus carros foram destruídos”.
“Mas isso é porque-”
“Tá, tá, eu sei. O sinal não foi com a sua cara, e ocmo você estava atrasado resolveu tentar a sorte... E qual foi o outro mesmo? Ah, sim, os outros motoristas te deixaram nervoso, dirigindo muito perto, e isso te enceu o saco... que nem a faixa do Reita.”
“Mas foi isso mesmo. Você que sabe se acredita ou não”.
“Eu acredito em você.” Aoi afirmou gentilmente. Ele sabia que o amigo estava triste, mesmo que não demonstrasse. “Vamos. Podemos parar e almoçar no caminho de casa.” Uruha pegou a sacola e sorriu docemente.
“Casa? Você não quis dizer a sua casa?”
“Bom, você está morando comigo agora, não está?” Uruha encolheu os ombros com a observação.
“Tem razão. Sabe, até que você é bem legal e inteligente pra alguém sem imaginação nenhuma”. Aoi franziu as sobrancelhas
“Ei, assim você me ofende.”
“Mas” Uruha levantou um dedo e sorriu, irônico “Perceba que eu te elogiei... usando um insulto”
“Nossa, me senti melhor então” Aoi ironizou, rindo da dancinha da vitória que Uruha fez.
“Você nunca pára?” Aoi perguntou, incrédulo.
“A vida é curta demais para parar. Olha, um déjà vu. Nós já conversamos sobre isso ontem à noite ou eu estava sonhando de novo?” Uruha perguntou, descendo as escadas e passando pelos policiais que patrulhavam o saguão do prédio.
“Nós conversamos, e você não estava sonhando... de novo. Eu nem sabia que você teve um sonho, pra começar”.
“Eu tive. E foi bizarro” Deus, o que um cara desses considerava estranho? Aoi abriu a porta para Uruha e seguiu atrás dele, deixando a porta se fechar sozinha. “Eu estava andando por uma rua, esta rua pra ser mais exato. E um homem estava voando por cima dos prédios, mas ninguém conseguia notar... só eu, porque eu achei muito legal e queria voar que nem ele”
“Mmhmm” Aoi resmungou, se acomodando no banco do motorista e esperando Uruha colocar o cinto de segurança.
“Então eu comecei a acenar e correr atrás dele pela rua, mas ele voava muito rápido e eu não conseguia alcançá-lo, e isso estava me deixando muito frustrado, e de repente ouvi uma buzina atrás de mim e quando virei, vi um caminhão vindo na minha direção, mas eu não conseguia me mexer. Eu estava apavorado, mas adivinha?” Uruha sorriu bobamente, esperando Aoi dizer algo. Aoi levantou a cabeça e olhou o retrovisor, tentando ajustá-lo e manter os olhos na estrada ao mesmo tempo.
“O quê?”
“Você apareceu do nada e me tirou do meio da rua. Não é demais?”
“Eu ter te salvado? Claro. Mas foi só um sonho.”
“Eu disse que era. Aí eu te abracei e te chamei pra dar um passeio, mas um moleque chato jogou sorvete em mim. Eu ia lá dar uns tabefes nele com você me dando o maior apoio, mas aí eu acordei, então não sei se cheguei a bater no moleque ou não, mas teria sido hilário”.
“Eu não te ajudaria a bater numa criança, Uru. Você realmente tem problemas”.
“Você parecia tão livre no sonho, Aoi. Talvez tenha algum significado”.
“Ah é? Qual?” Aoi freou de repente ao ver que o sinal estava vermelho.
“Eu acho que você devia ter mais imaginação, se soltar mais” Uruha bufou, se agarrando ao cinto enquanto o carro parava bruscamente.
“Eu acho que tem outro significado, Uruha”.
“Que seria...?”
“É pra você tomar mais cuidado” Uruha riu, concordando um pouco com a provocação. “Ou... que você tem um medo absurdo de morrer”.
“É outra das minhas fobias. Você não lê?”
“Eu pefiro compor” Aoi respondeu, sinceramente.
“Eu não lembro o nome... Eu nunca lembro quais são os nomes das minhas fobias quando tenho que falar delas”.
“Mas quantas você tem, Uruha?” Aoi olhou para ele, descrente.
“Mais do que eu me lembre...” E isso não parecia exagero.
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Meu Deus~ que pressa D:
Depois eu volto e comento ;D
Kissus
until tomorrow,
aoixuruha,
tradução