Mar 02, 2005 21:21
Terça-feira eu tive um grupo de estudo de Português na Receita até as 10 hrs da manhã, saí de lá e fui direto pra Biblioteca. Eu adoro bibliotecas e queria muito trabalhar em uma, só pra passar os dias ao contato daqueles mlhares de livros diferentes, cada um com suas estórias diferentes e temas diferentes.
Eu cheguei lá e já peguei 3 livros pra ir lendo, um que era "O Ser e o Nada" de Jean D. Saitre... ou alguma coisa assim, que por ser enorme eu deixei pra trazer pra casa e ler aqui, um livro "erótico" adolescente chamado "Entrevistando Jenifer" de uma italiana chamada Paola Milano e um livro na seção de Psicologia que (eu não lembro o nome do livro, nem autor) falava sobre a mortificação do eu em instituições de reclusão e exclusão do individuo na sociedade, como penitênciarias, internatos, manicômios, campos de concentração de Hitler e ordens religiosas. O livro por ser pequeno eu li lá na Biblioteca mesmo, falava das atrocidades cometidas nesses lugares que acabavam por transformar o individuo em um objeto inanimado e sujeito às humilhações alheias dentro da sociedade, esse processo de mortificação começa qdo lhe tiram todos os seus pertences que te identificam como um ser único. Por exemplo, a sua maneira de vestir, o corte do seu cabelo, aquele cordão que fica pendurado no seu pescoço, e tudo o mais que possa te dar uma identificação, como um RG. Após isso,é tirado de vocês todas as suas identificações natas, como por exemplos nos campos de concentração que eles obrigavam a todos ficarem nus e a rasparem a cabeça. Ficar nú era uma forma de se expor, de se deixar humilhar no seu estado mais frágil e o ato de rasparem as cabeças, retirarem todos os pertences das pessoas que ali estavam consistia em deixar todos iguais, como objetos fabricados em série, como ratos em que é impossivel identificar qual é um ou outro, com excessão aos tamanho e idade. Isso acontece também em em instituições religiosas o uso obrigatório do hábito, o ato de as novatas terem que mendigar restos de comida das madres e suas superioras, os uniformes dos internatos, penitenciárias e manicomios. A outra forma de mortificação do eu era você conseguir retirar de uma pessoa todo aquilo que a torna um ser humano, como quaisquer sentimento, orgulho, vaidade... através de castigos, humilhações, surras, apelidos ascos...Tudo isso transforma uma pessoa em um ser excluido da sociedade, sem um nome, sem identificação, sem sentimentos, sem orgulho... deixa a pessoa num estado em que ela se olha no espelho e consegue ver apenas o vidro e a prata. Entre os dois a imagem que se forma é de uma rés, um amontoado orgânico, sujo e nojento, um amontoado de células esquecido no Universo.
Tá. Esse livro me impressionou e eu fiquei pensando nele durante os dias e as noites, imaginando como as coisas aconteciam nos campos de concentração. Uma vez assisti a Lista de Schindler e aquele filme desenhou na minha cabeça a pior imagem possivel que uma pessoa poderia ter, tive raiva de Adolfo Hitler e de todos os que o ajudaram, tive nojo da raça humana e das formas que elas podem tomar, tive raiva do nazismo e de toda aquela bobeira de 'sangue puro'... sangue puro??? Foi a primeira vez em que vi um sangue totalmente infectado e infeccioso, um sangue sujo, impuro, incapaz de habitar um corpo humano. E eles ainda vêm com essa história de sangue puro??? O que li no tal livro, era muito pior do que eu assisti na lista de Schindler, o cotidiado dakelas pessoas mortificadas, sem consciência de si mesma, anestesiadas pelo sofrimento e humilhação.
Humilhação, a cada pagina que eu lia essa palavra latejava na minha cabeça, pulsava diante dos meus olhos. Como poderiam??? Nunca tinha imaginado nada igual, e senti vergonha da minha condiçaõ de garotinha urbana, que estudou em colégio particulares e que teve tudo na vida e que ainda reclama da vida. Eu reclamo de não poder comprar um óculos da Oskley pra perder um mês depois, reclamo de não ter todo o conforto que eu queria, e de repente leio tudo aquilo, me deparo com algo que para mim ainda soa irreal, desumano, algo descarnado...
É foda isso, e é um tapa na cara tbm. Daqueles assim: Acorda!!
E hoje eu passei o dia pensando em mim. em tudo o que me transforma na pessoa que eu sou, no que eu vi, no que desenha a minha personalidade diante dos meus olhos e dos olhares alheios. Cheguei em casa e deitei na minha cama, finalmente achei a chava do meu quarto e me tranquei. Deitei e tive uma sensação que eu nunca tive antes, como se tudo o que me rodeasse me completasse, como se a minha cama fizesse parte de mim... o meu quarto, apesar de ser novo, mas algo que tomou a minha forma, que se moldou de acordo com as minhas vontades e com o que eu queria. E aí eu aprendi o significado da 'mortificação do Eu'.. senti que não era nada sem aquilo que me rodeava. Para viver é necessário ter um mundo, e nãio apenas um espaço como todos temos, vivemos todos no mesmo espaço, cada um em seu mundinho,e é assim que tem que ser, isso é o que constrói a nossa personalidade, é o que nos faz viver, existir... Ter um mundinho só seu que eu quero dizer não é se trancar ao espaço alheio, se alienar e etc, e sim ter um refugio, que tem a sua cara, que se transformou junto com você. Esse mundinho, é o lugar em que vc vive, sua casa, seu quarto, sua cidade, seu planeta, sua cabeça... O que tem lá dentro é precioso, e se conseguirem tirar de você o se mundo, você morre, mortifica-se, se transforma naquele aglomerado celular em que eu falei anteriormente.
* Não sei o que me deu pra eu botar tudo isso pra fora, e escrever tanto...sinto que despejei as palavras nesse teclado e não sei ainda se elas fazem sentido. Não necessito que alguém leia, se conseguir ler tudo, gostaria que me dissesse algo sobre isso, senão, isso fico guardado pra mim. algo pra eu relembrar tudo isso.