Edição 1997 (1ª Edição 1881)
Isabel Archer, americana, pobre mas de boas famílias, é a senhora de que nos fala este livro e cuja personalidade é dissecada ao longo de 544 páginas. Henry James é um observador atendo e extremamente irónico. Como um biógrafo atento, acompanha Isabel quando ela passa a viver com a tia em Inglaterra e nas viagens posteriores pelo continente europeu. O autor convida o leitor a não julgar, a observar, a esperar, a ver o percurso desta mulher bonita, voluntariosa, inteligente e idealista. Ralph, o mordaz primo de Isabel, é também um espectador ávido da vida que ela pretende levar - até onde ela voará sem que as suas asas sejam cortadas. Doente crónico, sem pretensões a que Isabel corresponda ao amor que sente por ela, oferece-lhe a hipótese de ela satisfazer qualquer tipo de desejo. E Isabel deseja viajar, conhecer o mundo, saborear a sua liberdade intocada. Inconsciente de que foi o primo que a fez rica de forma a poder acompanhar a sua evolução sem que existisse qualquer tipo de barreira, mantem-se solteira apesar das investidas amorosas dos homens que a rodeiam: Warburton e Caspar Goodwood, um lorde inglês e um empresário americano. Será Madame Merle, de maneiras doces e desígnios obscuros que a apresentará a Osmond, o coleccionador de raridades. E Isabel é rara.
"Portrait of a Lady" traz-nos uma colecção de personagens cheios de cor, únicos, de personalidade própria. Nenhum deles, nem mesmo Isabel ou Osmond, é herói ou vilão. Todos são culpados de inflingir algum tipo de dor ou desapontamento a outros, e todos são desculpados por sofrer a sua quota parte. O destino, também ele nem herói nem vilão, é a sombra que acompanha Isabel, que lhe molda a vida e que a torna diferente daquilo que ela sempre delineou para si.
Óptimamente bem escrito numa linguagem quase jornalística, sem ser aborrecido apesar de extenso, com descrições que pintam cenários, com personagens credíveis e pouco romanceadas e sem o final cor-de-rosa que quase se espera (tipico, por exemplo, de Jane Austen ou das irmãs Brontë), este livro foi uma surpresa deliciosa.
Terminei de o ler esta madruagada, numa última maratona feroz de 5 horas, com lágrimas misturadas com um sorriso auto-consciente: podemos conhecer-nos a nós próprios, até mesmo a alguns dos outros que atravessam a vida conosco, mas não conhecemos o destino que nos espreita por cima do ombro. A não ser, talvez, quando já é demasiado tarde.