há um ano

Jul 19, 2019 11:10

O dia hoje começou muito cedo com uma ida ao hospital para tratar de procedimentos prévios à cirurgia. Foi aventada a possibilidade de eu ter de ser internado uns dias antes da intervenção, para fazer profilaxia com antibióticos. O cateter da minha urostomia entope com facilidade e de cada vez que isso acontece fico com febre, o que significa que se desencadeia ali um processo infeccioso.

Há um ano, estava internado no hospital, tinha feito a nefrectomia há uns dez dias e estava a recuperar. No dia 18 ao final da tarde tive a notícia de que o meu irmão, em Moçambique, estava muito mal. No dia 19, acordei com a notícia de que tinha morrido nessa noite.

Há dias na nossa vida que não conseguimos esquecer. Momentos em que a angústia atinge um paroxismo, e parece que ficam para sempre a vibrar na nossa mente como uma ferida aberta. Infelizmente nos últimos anos tenho vivido alguns momentos desses, mais do que aqueles que eu suporia que conseguisse aguentar. E tenho muito medo que o futuro próximo me guarde mais momentos desses.

Na noite que se seguiu não dormi nada, perturbado com a notícia da morte do meu irmão, e com alguns telefonemas aflitos que recebi de amigos, alguns muitos antigos e longínquos, que ouviram a notícia e me telefonaram sem fazerem ideia da situação em que eu estava. No dia seguinte tive alta, mas nas primeiras noites em casa continuei sem conseguir dormir, sempre a pensar no assunto.

A pensar na morte do meu irmão, na tristeza que a minha cunhada e os meus sobrinhos estariam a sentir. Mas também a pensar na minha forma de lidar com a morte do meu irmão. Sozinho, doente, afastado do resto dos familiares mais próximos, foi muito difícil fazer a catarse e o luto dessa perda. Ainda hoje sinto que me ficou a faltar alguma coisa, que houve uma vivência qualquer que me escapou, e que tivesse ajudado a sarar essa ferida e a reconciliar-se comigo mesmo. Por isso, ainda hoje sinto a morte do meu irmão como mais uma das perdas que a doença me infligiu. E talvez seja isso que me leva a, no meio do meu próprio sofrimento e da minha angústia, por vezes esquecer as saudades que eu tenho de ter um irmão, de ter o meu irmão.

um irmão, caro diario

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