Richard Feynman foi um físico brilhante, tendo estado envolvido no projecto da bomba atómica, e tendo recebido um prémio Nobel. na sua autobrografia intitulada '"Está a brincar Sr. Feynman!" - retrato de um físico enquanto homem' ele conta a sua vida de uma forma muito interessante.
Deixo aqui uma parte para vossa leitura de discussão sobre uma maneira de tratar mulheres contada por ele na primeira pessoa:
É só pedir-lhes?
Quando fui para Cornell, correspondia-me com uma rapariga que conhecera no Novo México, quando trabalhava na bomba. Comecei a pensar, quando ela mencionou outro tipo qualquer que conhecia, que o melhor que tinha a fazer era ir lá rapidamente no fim do ano lectivo para tentar salvar a situação. Mas, quando lá cheguei, descobri que era tarde de mais, pelo que acabei num motel em Albuquerque, com um Verão livre e nada que fazer.
O Motel Casa Grande era na Route 66, a estrada principal que atravessa a cidade. Na mesma estrada, um pouco mais abaixo, havia um pequeno clube nocturno que tinha espectáculo. Como não tinha nada que fazer e gostava de observar as pessoas nos bares e de as conhecer, ia muitas vezes a esse clube.
Quando fui lá pela primeira vez, a certa altura, estando a falar com um tipo no bar, reparámos numa mesa inteira cheia de lindas jovens - acho que eram hospedeiras da TWA - que estavam a fazer uma espécie de festa de aniversário. O outro tipo disse: “Venha, vamos arranjar coragem e convidá-las para dançar.”
Portanto, convidámos duas delas para dançar e depois elas convidaram-nos para nos sentarmos à mesa com as outras raparigas. Depois de umas bebidas, aproximou-se o criado: “Alguém Quer alguma coisa?”
Eu gostava de imitar um bêbado, pelo que, apesar de estar completamente sóbrio, me voltei para a rapariga com quem tinha estado a dançar e lhe perguntei com voz de bêbado: “Você quer alguma coisa?”
“O que é que podemos tomar?”, perguntou ela.
“Tuuuuuuuuuuuudo o que quiserem, TUDO!”
“Está bem! Tomamos champanhe!”, diz ela alegremente.
Por isso digo numa voz alta, que toda a gente que está no bar pode ouvir: “Está bem! Ch-Ch-champanhe para tooodos!”
Depois ouço o meu amigo a falar com a minha rapariga, dizendo que era indecente “apanhar-lhe toda aquela massa por ele estar bêbado”, e começo a pensar que talvez tenha cometido um erro.
Bem, de modo simpático, o criado aproxima-se de mim, inclina-se e diz em voz baixa: “Custa dezasseis dólares cada garrafa.”
Decidido a desistir da ideia do champanhe para toda a gente, pelo que digo em voz ainda mais alta do que antes: “DEIXE LÁ!”
Fiquei por isso bastante surpreendido quando, uns momentos depois, o criado volta com todas aquelas coisas requintadas - um guardanapo no braço, um tabuleiro cheio de taças, um balde de gelo cheio de gelo e uma garrafa de champanhe. Ele pensou que eu queria dizer: “Deixe lá o preço”, quando eu queria dizer: “Deixe lá o champanhe!”
O criado serviu champanhe a todos, e eu paguei os dezasseis dólares e o meu amigo ficou furioso com a minha rapariga porque pensou que ela me tinha feito pagar toda aquela massa. Mas, no que me diz respeito, a coisa acabou aí, embora mais tarde tenha sido o início de uma nova aventura.
Eu ia bastantes vezes àquele clube e, à medida que as semanas passavam, os espectáculos mudavam. Os artistas andavam num circuito que passava por Amarillo e por muitos outros lugares no Texas, e sabe Deus por que outros sítios. Havia também uma cantora permanente do clube, chamada Tâmara. Cada vez que chegava um novo grupo de artistas ao clube, Tâmara apresentava-me uma das raparigas do grupo.
A rapariga sentava-se à minha mesa, eu oferecia-lhe uma bebida e conversávamos. Claro que eu gostaria de fazer mais do que apenas conversar, mas acontecia sempre qualquer coisa no último momento. Por isso eu não conseguia compreender porque é que a Tâmara se dava ao trabalho de me apresentar todas aquelas raparigas simpáticas e depois, apesar de as coisas começarem muito bem, eu acabava sempre por oferecer bebidas e passar a noite a conversar, mas mais nada. O meu amigo, que não tinha a vantagem das apresentações de Tâmara, também não conseguia nada - éramos ambos uns falhados.
Ao fim de umas semanas de espectáculos diferentes e de diferentes raparigas, veio um novo espectáculo e, como de costume, Tâmara apresentou-me uma rapariga do grupo e passou-se tudo como habitualmente - ofereço-lhe bebidas, conversamos e ela está a ser muito simpática. Foi fazer o espectáculo e depois voltou para a minha mesa, e senti-me bastante bem. As pessoas olhavam e pensavam: “Que terá o tipo que faz com que esta rapariga vá ter com ele?”
Mas depois, em qualquer ocasião perto do fim da noite, ela disse uma coisa que por essa altura eu já ouvira muitas vezes: “Gostava que viesse ao meu quarto esta noite, mas temos uma festa, por isso talvez amanhã à noite…” - e eu sabia o que este “talvez amanhã à noite” significava: NADA.
Bem, reparei ao longo da noite que esta rapariga - chamava-se Gloria - falava muitas vezes com o mestre-de-cerimónias durante o espectáculo e quando ia e voltava da casa de banho das senhoras. Por isso, uma vez, quando ela estava na casa de banho e o mestre-de-cerimónias passou perto da minha mesa, deitei-me de repente a adivinhar e disse-lhe: “A sua mulher é muito simpática.”
Ele respondeu: “Pois é, muito obrigado”, e começámos a conversar um pouco. Ele pensou que ela me tinha dito. Por isso conversaram os dois comigo um bocado e convidaram-me a ir a casa deles nessa noite, depois de o bar fechar.
Às duas da manhã fui com eles para o seu motel. Claro que não havia nenhuma festa e conversámos durante muito tempo. Mostraram-me um álbum com fotografias de Gloria quando o marido a conheceu em Iowa, uma mulher gorducha; depois outras fotografias dela à medida que ia emagrecendo, e agora estava mesmo elegante! Ele tinha-lhe ensinado todo o género de coisas, mas ele não sabia ler nem escrever, o que era particularmente interessante, porque lhe competia, como mestre-de-cerimónia, ler os nomes dos números e dos artistas que faziam parte do concurso de amadores e eu nem tinha reparado que ele não sabia ler o que estava “a ler”! (Na noite seguinte vi o que eles faziam. Quando ela trazia ou levava uma pessoa ao palco, olhava para o papel que ele tinha na mão e segredava-lhe, ao passar, os nomes dos próximos artistas e o título do número.)
Gloria replicou: “Quando Tâmara estava para nos apresentar, disse: ‘Agora vou apresentar-te o verdadeiro mãos largas cá do sítio!’”
Tive de pensar um momento antes de compreender que a garrafa de champanhe de dezasseis dólares comprada com um tão vigoroso e mal compreendido “deixe lá!” fora afinal um bom investimento. Eu tinha aparentemente a fama de ser uma espécie de excêntrico que vinha sempre sem estar vestido a rigor, sem um fato decente, mas sempre pronto a gastar montes de dinheiro com as raparigas.
Finalmente disse-lhes que havia uma coisa que me intrigava: “Sou razoavelmente inteligente”, disse eu, “mas provavelmente só para a física. Naquele bar há uma data de tipos inteligentes - tipos do petróleo, tipos dos minerais, homens de negócios importantes, etc. - que estão sempre a pagar bebidas às raparigas, sem receberem nada em troca!” (Nesta altura tinha eu deduzido que os outros todos também não conseguiam nada com todas aquelas bebidas.) “Como é possível”, perguntei eu, “que um tipo ‘inteligente’ possa ser tão palerma quando entra num bar?”
O mestre disse: “Disto percebo eu. Sei exactamente como tudo funciona. Vou dar-lhe umas lições, para que daqui em diante você possa conseguir alguma coisa de uma rapariga num bar destes. Mas antes de lhe dar lições tenho de lhe demonstrar que sei realmente do que estou a falar. Para isso, Gloria vai conseguir que um homem lhe pague a si um cocktail de champanhe.”
“Está bem”, digo eu, embora pense: “Como é que eles vão fazer isto?”
O mestre continuou: “Agora tem de fazer exactamente o que lhe dissermos. Amanhã à noite deve sentar-se no bar, a alguma distância de Gloria, e, quando ela lhe fizer sinal, basta-lhe passar perto dela.”
“Sim”, diz Gloria. “Vai ser fácil.”
Na noite seguinte entro no bar e sento-me num canto, onde posso ir olhando para Gloria a uma certa distância. Ao fim de algum tempo, de facto, está um tipo sentado com ela e, passado mais um bocadinho, o tipo está todo contente e Gloria pisca-me um olho. Levanto-me e passo com ar indiferente. Quando vou mesmo a passar, Gloria volta-se e diz com uma voz verdadeiramente amigável e animada: “Oh, olá, Dick! Quando é que voltou? Onde esteve?”
Neste momento o tipo volta-se e vê quem é este “Dick”, e vejo nos seus olhos algo que compreendo completamente, por me ter encontrado tantas vezes nessa posição.
Primeiro olhar: “Oh, oh, vem aí um competidor. Vai levá-la depois de eu lhe ter pago uma bebida! O que vai acontecer?”
Olhar seguinte: “Não, é só um amigo casual. Parecem conhecer-se há algum tempo.” Eu via isto tudo. Lia-o na cara dele. Sabia exactamente o que ele sentia.
Gloria volta-se para ele e diz: “Jim, quero apresentar-lhe um velho amigo meu, Dick Feynman.”
Olhar seguinte: “Já sei o que vou fazer. Vou ser simpático para este tipo para ela gostar de mim.”
Jim volta-se para mim e diz: “Olá, Dick. Que tal uma bebida?”
“Óptimo!”, digo eu
“O que quer tomar?”
“Seja o que for que ela está a tomar.”
“Empregado, outro cocktail de champanhe, por favor.”
Portanto foi fácil; não custou nada. Nessa noite, depois de o bar fechar, fui novamente ao motel onde estavam Gloria e o mestre. Estavam sorridentes, contentes com o modo como tudo tinha corrido. “Muito bem”, disse eu, “estou absolutamente convencido de que vocês os dois sabem muito bem do que estão a falar. E agora, quanto às lições?”
“Está bem”, diz ele. “O princípio completo é este: o tipo que ser um cavalheiro. Não quer que o tomem por indelicado, por rude ou especialmente por sovina. A rapariga, conhecendo tão bem os motivos do tipo, não tem dificuldade em o orientar na direcção em que quer que ele vá.”
“Portanto”, continuou ele, “não seja em nenhuma circunstância um cavalheiro! Deve desrespeitar as raparigas. Mais, a primeira de todas as regras é: não pague nada a uma rapariga - nem sequer um maço de cigarros - antes de lhe ter perguntado se vai dormir consigo e de estar convencido de que ela vai e não está a mentir.”
“Uh… quer dizer… não se… uh… basta pedir-lhes?”
“Está bem”, diz ele, “eu sei que é a sua primeira lição e é possível que lhe custe ser tão brusco. Por isso pode comprar-lhe uma coisa, qualquer coisinha, apenas - antes de pedir. Mas, por outro lado, isso só vai dificultar as coisas.”
Bem, basta que me dêem o princípio, que eu completo a ideia. Durante todo o dia seguinte construí a minha psicologia de modo diferente: adoptei a atitude de que aquelas raparigas de bar são todas umas pegas, que não valem nada, que só lá vão para nos fazer pagar-lhes uma bebida e não nos tencionam dar absolutamente nada: não vou ser um cavalheiro para aquelas pegas que não valem nada, etc. Estudei aquilo até se tornar automático.
Então, nessa noite, estava pronto para experimentar. Entro no bar como de costume e o meu amigo diz logo: “Eh, Dick! Espere até ver a rapariga que arranjei esta noite! Teve de ir mudar de roupa, mas volta já.”
“Sim, sim”, digo eu, sem me impressionar, e sento-me na outra mesa para ver o espectáculo. A rapariga do meu amigo entra na altura em que está a começar o espectáculo e eu penso: “Estou-me nas tintas para a beleza dela; só vai conseguir que ele lhe pague bebidas e não lhe vai dar nada!”
Depois da primeira parte o meu amigo diz: “Eh, Dick! Quero apresentar-lhe a Ann. Ann, este é um grande amigo meu, Dick Feynman.”
Digo “Olá” e continuo a olhar para o espectáculo.
Uns momentos depois Ann diz-me: “Porque não vem sentar-se aqui à mesa connosco?”
Penso para comigo: “É mesmo uma pega: ele é que lhe paga as bebidas e ela convida outra pessoa para a mesa.” Digo: “Vejo bem daqui.”
Um pouco depois entra um tenente de uma base militar próxima, usando um belo uniforme. Dentro de pouco tempo vemos Ann sentada do outro lado do bar com o tenente!
Nessa noite, mais tarde, estou sentado no bar, Ann dança com o tenente e, quando ele está de costas para mim e ela de frente, ela sorri-me agradavelmente. Penso novamente: “Grande pega! Agora está a fazer o mesmo truque, até com o tenente!”
Então tenho uma boa ideia: não olho para ela até que ele me possa ver também, e então devolvo-lhe o sorriso, para que o tenente saiba o que se está a passar. Assim, o truque dela não resultou durante muito tempo.
Uns minutos depois, ela já não está com o tenente; está a pedir ao empregado do bar o casaco e a bolsa, dizendo em voz alta e clara: “Apetece-me dar um passeio. Alguém quer dar um passeio comigo?”
Penso para comigo: “Podemos dizer que não e repeli-las, mas não o podemos fazer permanentemente, ou não conseguimos nada. Chega uma altura em que temos de alinhar.” Por isso digo friamente: “Eu dou um passeio consigo.” Saímos. Descemos a rua um bocado, vemos um café e ela diz: “Tenho uma ideia: vamos comprar café e sanduíches e vamos para minha casa comê-las.”
A ideia parece bastante boa e, por isso, entramos no café, ela pede três cafés e três sanduíches e eu pago-os.
Quando saímos do café, penso: “Há qualquer coisa errada: são sanduíches a mais!”
A caminho do motel ela diz: “Sabe, não vou ter tempo de comer as sanduíches consigo, porque há um tenente que vem…”
Penso para comigo: “Pronto, fiz asneira. O mestre ensinou-me o que fazer e eu fiz asneira. Comprei-lhe 1 dólar e 10 cêntimos de sanduíches, não lhe pedi nada e agora sei que não vou apanhar nada! Tenho de recuperar, quanto mais não seja pelo brio do meu professor.”
Paro de repente e digo-lhe: “Você… é pior do que uma PROSTITUTA!”
“O que é que quer dizer com isso?”
“Você fez-me comprar estas sanduíches e o que é que eu recebo em troca? Nada!”
“Bem, seu sovina!”, diz ela, “se é assim que pensa, eu pagolhe as sanduíches!”
Desafiei-a: “Então, pague.”
Ficou atónita. Pegou no porta-moedas, tirou o pouco dinheiro que tinha e deu-mo. Peguei na minha sanduíche e no meu café e fui-me embora.
Depois de ter acabado de comer voltei ao bar para contar ao mestre. Expliquei-lhe tudo e disse-lhe que lamentava ter feito asneira, mas tinha tentado recuperar.
Ele disse muito calmamente: “Está bem Dick; está tudo bem. Como acabou por não lhe pagar nada, ela vai dormir consigo esta noite.”
“O quê?”
“É verdade”, disse ele, confiante; “vai dormir consigo. Eu sei.”
“Mas ela nem sequer está aqui! Está em casa com o te…”
“Está bem.”
Chegam as duas horas, o bar fecha e Ann não aparece. Pergunto ao mestre e à mulher se posso ir novamente a casa deles. Eles dizem: “Com certeza.”
Quando íamos mesmo a sair do bar, aparece Ann, atravessando correr a Route 66 na minha direcção. Dá-me o braço e diz: “Venha, vamos a minha casa.”
O mestre tinha razão. A lição fora óptima!
Um dia, no Outono, quando me encontrava novamente em Cornell, estava a dançar com a irmã de um estudante que tinha vindo de Virgínia fazer uma visita. Era muito simpática e de repente tive esta ideia: “Vamos a um bar tomar uma bebida”, disse eu.
A caminho do bar tentei arranjar coragem para experimentar a lição do mestre numa rapariga vulgar. No fim de contas, não nos sentimos tão mal a desrespeitar uma rapariga de bar que tenta fazer-nos pagar-lhe bebidas - mas uma rapariga sulista, simpática e vulgar?
Entrámos no bar e, antes de me sentar, disse: “Ouça, antes de lhe oferecer uma bebida quero saber uma coisa: vai dormir comigo esta noite?”
“Sim.”
Por isso dava resultado até com uma rapariga vulgar! Mas, por muito eficaz que a lição fosse, na realidade não a voltei a usar depois disso. Não me agradava proceder dessa maneira. Mas foi interessante saber que as coisas funcionavam de modo muito diferente do que me tinham ensinado.