(no subject)

Jan 30, 2004 21:03

Tentei escrever um conto.... Dois parágrafos curtos que acabaram por ser despejados na gavetas das ideias por encaixar, no saco da potência que espera por ser acto, acumulando-se com tantas outras ideias que esperam por ser reutilizadas... Queria mesmo escrever um conto mas pura e simplesmente não consegui...
Mesmo assim tenho de admitir que tinha saudades de pegar na caneta e brincar com os despojos duma criatividade já gasta que precisa de ser renovada. Por muitas frases, palavras, sílabas, letras a que possa recorrer estes atingem o seu limite, como uma lâmpada que após bastante uso se acaba por fundir...
É que há dias que se tornam semanas na mente e, no entanto, apenas umas fugazes horas cá fora na realidade... Quando uma névoa de tom cinza nos envolve, ocultando-nos o caminho e sem darmos por isso somos levados para um interminável e bem escuro túnel, no qual procuramos incessantemente pela ténue luz que se encontra no seu fundo. Como a caverna da qual Platão falava, na qual aqueles que se encontravam cativos apenas podiam vislumbrar sombras do que aquilo que existe realmente é...
É bom escrever. É bom poder criar um plano de fuga, uma terapia, um filtro contra todas as agressões e frustrações que decorrem ao longo da nossa vivência. É bom poder agarrar nas palavras e poder, de acordo com certas regras, como a matemática, ou aleatoriamente, como as peças de Lego, originar uma pequena realidade paralela, um abrigo para aquelas alturas em que o mundo se torna inóspito e inconscientemente nos retraímos, assustados, perdidos, à deriva num tempestuoso mar de suposições e no qual as ideias se revelam como uma bússola, a caneta um farol e o papel um porto seguro... É bom libertar o que de outro modo estava destinada a ser recalcado...
É bom poder moldar o barro do qual brotam as ideias, após um longo tempo de gestação (por vezes uma vida inteira, apenas se mostrando quando o sopro final é expelido), fadas de um imaginário que lentamente se deixa morrer para encarnar no véu do que já foi exprimido, tal como um rio de cores douradas que vagarosamente flui... Como um feitiço que, progressivamente, se intensifica...
É bom saber que ainda consigo escrever e, abstrair-me de tudo, deixando as ideias deslizarem livremente e, ao pensar nisto, sorrir de contentamento...
Mesmo sabendo que o que eu realmente queria era escrever um conto...
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