Sep 26, 2014 17:31
Estava trabalhando num bunker empoeirado vasculhando material para auxiliar burocratas da pior índole. Era um lugar escuro onde a decoração eram pilhas de papéis e um computador 486. Naquele buraco que também lembrava um abrigo nuclear era onde, dizia seu chefe, surgiam todas as decisões estratégicas daquela empresa.
A empresa por sua vez vendia coisas que ninguém queria comprar. Coisas impossíveis de vender com cores e sabores em nada atrativos. E o cérebro, onde ele trabalhava tinha a função milagrosa de vender essas coisas.
Porém, trabalhava naquele lugar outros bois. Bois cansados, desanimados... Eles vendiam, além do produto da empresa, sua própria carne e alma. Sem isso, não comeriam o capim nosso de cada dia. Mas há ainda um aspecto muito peculiar para citar sobre essa empresa.
Além dessa empresa vender algo que ninguém queria comprar, ter um cérebro confuso e empoeirado e obrigar os seus funcionários a vender a própria carne e alma para comer capim, essa famosa empresa privilegiava os maus bois. Desculpe. A definição está incorreta. Não existia ali critério para o abate de bois.... Sim, vez ou outra bois eram abatidos, afinal, o proprietário da empresa adorava hambúrguer! Mas o ponto não é esse. Os bois eram simplesmente abatidos, sem mais nem menos.
Independente do boi ter pouca ou muita carne, vez ou outra rolava ali um abate. Mortos, degolados e com a alma destruída, apenas sai daquela empresa carcaça. Nada que impressionasse ninguém. Diz a lenda que uma vez acabou a energia elétrica na hora do abate, e usaram uma marreta para finalizar o procedimento. A ética, moral e respeito pelos bois não era o norte do mundo naquela época.
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Havia um boi ali, aquele mesmo que vasculhava toda a papelada do cérebro que cansou e parou. Por ser o único boi com dedos, conseguia fazer aquele trabalho monótono como ninguém. E por esse motivo ele não se sentia um alvo de abate.
Por outro lado, tinha muita estima pelos outros bois e não tinha muito prazer em ver os bois sendo abatidos sem mais nem menos. "Ora, se ao menos dessem um motivo... Mas por sadismo?", pensava.
Certo dia não compareceu mais no buraco que os bois do exterior chamavam de "workplace". Mas deixou uma carta.
"Estou me retirando daqui, pois tenho princípios norteados pela ética, moral e respeito aos outros bois. Justificar isso pelo fato do mundo ser assim é para pessoas fracas, que preferem escolher o caminho mais simples (do abate), pelo simples fato de não precisar lidar com os outros bois. Por isso, gostaria de deixar um recado para vocês: hoje vocês vão comer hambúrguer de soja, que esse bife não lhe pertence”.
hoje vocês vão comer hambúrguer de soja,
que esse bife não lhe pertence