caderno de infância

Apr 28, 2002 13:57

Aquele caderninho continha todos os pedacinhos da sua vida. No início, letras tortas e grandes contavam as aventuras da sua infância. De como uma borboleta tinha pousado no seu nariz, ou de como se tinha assustado quando o sapo do lago tinha saltado para o seu lado, quando estava deitada na relva a contar estrelas. Depois, foi crescendo. Depressa, depressa demais. Vieram as primeiras dúvidas, as primeiras angústias e quando deu por si já nada tinha a ver com aquela menina de cabelo aos caracóis que todos os dias trazia um bichinho diferente para casa. Agora, era uma menina num corpo de mulher. Um corpo que não reconheci como seu, do qual não gostava.

Um dia, sentada num banco de maneira que outrora fora vermelho, escrevendo naquele caderno cheio de fotografias, memórias rabiscadas e flores secas, decidiu começar tudo de novo. Correu para dentro de casa, para a cozinha que cheirava a biscoitos de limão, e lançou o velho caderno ara dentro do fogão a lenha. Lágrimas escorreram ao vê-lo arder nas labaredas.

Não estava mais presa ao passado. Trocou o campo pela praia, os sapos pelos caranguejos, as borboletas pelas gaivotas, as lágrimas pelos sorrisos. Toda ela tinha renascido daquelas cinzas...
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