Dos Tetos da Vida
Aquele teto não era seu. No seu havia umidade, e reboco caindo, e um lustre pela metade, de quando a lâmpada queimara e tirara a redoma de vidro, que caiu e quebrou quando sua gata tentou entrar nela. Tantos anos sem mudar seu teto e agora em poucos meses o mudara três vezes. Era engraçado como seus olhos sempre prendiam-se lá, nos tetos, desta vez ele era azul claro com marcas de cola em algumas partes, sorriu; conseguia imaginar uma trilha de estrelas coladas, e pelas marcas de ganchos, algumas eram penduradas, e era esse o motivo de estar ali. Olhou para o lado, sentiu conforto ao ver Anakin e Obi-Wan virados de costas, gostava de se fingir pensativa enquanto os olhava e gostava de virá-los para a parede, dizendo que Jedis não podiam ver certas coisas, nos últimos dias havia sido como um ritual, enquanto ouvia barulhos desconhecidos de coisas sendo jogadas para dentro do armário, ou até mesmo para fora dele, observava os bonecos e dizia que sentia falta do Chewie, só pra ser lembrada de que o levara na primeira vez que estivera ali como garantia de amor eterno, mesmo que já não acreditasse nisso, visto o fato de alternar tetos. Sabia que tudo começara com uma discussão idiota sobre sabres de luz, e terminara com sabres de luz de papel, ela tendo uma perna cortada e risadas, era uma luz para ela, brigas e faz de conta, seus maiores vícios seguidos por risadas irônicas. Mas aquela inquietude já conhecida, aquele fraco sinal de que devia ir embora, de que aquele teto não era seu, apenas a informava que não tardaria a ir, e porque? Se as lembranças eram felizes, se a música ao fundo era perfeita, mesmo que estivesse sendo repetida pela sabe-se lá qual vez, ainda tinha vontade de cantar junto. E aquele formigamento em forma de vontade, de quando é urgente se virar na cama, vire logo para a direita, e então ela vê, o motivo de querer sair, de olhos fechados e sorriso no rosto, o cabelo tão curto que não a lembraria de outros tetos, a pele morena pra sentir o prazer do contraste. Você vai, ele sabia, você volta? Dúvidas. Talvez dia 6. Até dia 7? Talvez. Como eu vou te achar? Vou estar florida. E sorrindo. Sempre.